
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5027616-68.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: ROMILDO LAVIA
Advogados do(a) AGRAVADO: CLAITON LUIS BORK - SP303899-A, FRANCIMEIRE ALBUQUERQUE DA SILVA SOUZA - SP310301
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5027616-68.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: ROMILDO LAVIA
Advogados do(a) AGRAVADO: CLAITON LUIS BORK - SP303899-A, FRANCIMEIRE ALBUQUERQUE DA SILVA SOUZA - SP310301
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de agravo interno interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face da decisão monocrática (Id 310049480) proferida em 12.12.2024, que negou provimento ao seu recurso de agravo de instrumento, mantendo a decisão de primeiro grau que fixou o valor da execução em R$ 345.322,31 (trezentos e quarenta e cinco mil, trezentos e vinte e dois reais e trinta e um centavos), posicionado para maio de 2020, de acordo com os cálculos apresentados pela contadoria judicial.
Em suas razões (Id 310424284), a Autarquia, inicialmente, justifica a interposição do recurso para fins de viabilizar o acesso às instâncias superiores. Ainda em preliminar, o INSS defende a suspensão do processo em razão da interposição e admissão pela egrégia Vice-Presidência de Recurso Especial e Extraordinário no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 5022820-39.2019.4.03.0000. No mérito, sustenta ser incorreto utilizar a média dos últimos 36 (trinta e seis) salários-de-contribuição para verificar se houve, ou não, limitação ao MVT vigente à época da concessão do benefício; que não cabe evoluir a RMI do benefício até o teto das EC n. 20/1998 ou 41/2003 para fins de comparação com os novos tetos, pois tanto o IRDR quanto o RE 564.354 vedam essa evolução, fixando o momento da concessão como paradigma para análise do direito à revisão; que apenas o MVT deve ser analisado como teto; que não é possível verificar a existência do direito sem a análise do processo administrativo de concessão do benefício; e que eventual limitação do MVT e proveito econômico daí decorrente devem ser demonstrados na fase de conhecimento, ônus que cabe à parte autora. Subsidiariamente, pede a anulação da sentença e que o processo seja remetido para a primeira instância para verificação do MVT e apuração de eventual proveito econômico. Ademais, pelo princípio da eventualidade, pede a remessa dos autos à contadoria para que seja realizado novo cálculo, uma vez que o cálculo apresentado nos autos não teria sido conduzido conforme o título executivo.
A parte agravada apresentou sua manifestação (Id 314044101).
É o relatório.
10ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5027616-68.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: ROMILDO LAVIA
Advogados do(a) AGRAVADO: CLAITON LUIS BORK - SP303899-A, FRANCIMEIRE ALBUQUERQUE DA SILVA SOUZA - SP310301
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
É cabível o agravo interno contra decisum proferido pelo Relator, sendo submetida a decisão unipessoal ao respectivo órgão colegiado, nos termos do art. 1.021 do CPC.
É assente a orientação pretoriana, reiteradamente expressa nos julgados desta Corte Regional, no sentido de que o órgão colegiado não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não estiver devidamente fundamentada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e for passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte.
No caso, o INSS não trouxe nenhum argumento apto a infirmar os fundamentos que embasaram a decisão que negou provimento a seu agravo de instrumento, conforme teor que segue colacionado:
"Da aplicação dos tetos na renda mensal dos benefícios previdenciários fixados pelas Emendas Constitucionais n. 20/1998 e 41/2003 (Tema STF n. 76 e Tema STJ n. 1140).
A Constituição da República de 1988, em sua redação original, ao tratar da Previdência Social nada dispôs sobre a limitação dos valores dos benefícios previdenciários.
A legislação ordinária, por sua vez, estabeleceu valores mínimos e máximos para os salários de contribuição, bem como para os salários de benefícios e para as rendas mensais.
Os limites para os salários de contribuição foram previstos pelo artigo 28 da Lei n. 8.212/1991:
“Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
(Omissis)
§ 3º O limite mínimo do salário-de-contribuição é de um salário-mínimo, tomado no seu valor mensal, diário ou horário, conforme o ajustado e o tempo de trabalho efetivo durante o mês.
§ 4º O limite mínimo do salário-de-contribuição do menor aprendiz corresponde à sua remuneração mínima definida em lei.
§ 5º O limite máximo do salário-de-contribuição é de Cr$170.000,00 (cento e setenta mil cruzeiros), reajustado a partir da data da entrada em vigor desta lei, na mesma época e com os mesmos índices que os do reajustamento dos benefícios de prestação continuada da Previdência Social.”
Neste ponto, é importante diferenciar, sucintamente, salário de benefício e renda mensal.
O salário de benefício é um valor base, referencial, obtido a partir da média aritmética dos salários de contribuição do segurado que integrarão o cálculo do benefício previdenciário a ser concedido, limitado ao teto.
Já a renda mensal é o valor da aposentadoria a ser percebida mensalmente. Essa renda mensal é obtida a partir do salário de benefício calculado, aplicando-se sobre ele eventuais redutores legais decorrentes da espécie do benefício, como em razão da idade e expectativa de vida. E essa renda mensal, após a data do início do benefício, passa a sofrer periódicos reajustes, fixados pelo Poder Executivo, com o propósito de manter o poder aquisitivo. Como tais reajustes também podem conter reajustes reais, acima da inflação, sobre as rendas mensais também são aplicados os limites máximos (tetos), com previsão legal específica.
Os limites para os salários de benefícios estão previstos no § 2.º do artigo 29 da Lei n. 8.213/1991:
“Art. 29. O salário-de-benefício consiste:
(Omissis)
§ 2º O valor do salário-de-benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição na data de início do benefício.”
Já os limites para as rendas mensais estão previstos no “caput” do artigo 33 da Lei n. 8.213/1991:
“Art. 33. A renda mensal do benefício de prestação continuada que substituir o salário-de-contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado não terá valor inferior ao do salário-mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição, ressalvado o disposto no art. 45 desta Lei.”
Anota-se que o Congresso Nacional promulgou as Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003, fixando o limite máximo para o valor dos benefícios previdenciários:
Emenda Constitucional n. 20/1998 (publicada em 16.12.1998)
“Art. 14 - O limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição Federal é fixado em R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), devendo, a partir da data da publicação desta Emenda, ser reajustado de forma a preservar, em caráter permanente, seu valor real, atualizado pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.”
Emenda Constitucional n. 41/2003 (publicada em 31.12.2003)
“Art. 5º O limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição Federal é fixado em R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais), devendo, a partir da data de publicação desta Emenda, ser reajustado de forma a preservar, em caráter permanente, seu valor real, atualizado pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.”
Diante da incidência dos limites máximos (tetos) em três situações distintas (salário de contribuição, salário de benefício e renda mensal) e as Emendas Constitucionais não disciplinarem a aplicação prática dos novos tetos, a questão foi submetida ao excelso Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, por meio do “leadind case” RE 564354/SE (Tema STF n. 76). A Corte, por maioria, acompanhou o voto da Ministra Relatora Cármen Lúcia, para negar provimento ao recurso extraordinário do INSS contra acórdão proferido pela Turma Recursal da Seção Judiciária de Sergipe no recurso inominado n. 2006.85.00.504903-4.
Ao negar provimento ao recurso extraordinário do INSS, que sustentava a distinção entre a aplicação prática do teto do salário de benefício e o teto das rendas mensais, o Supremo Tribunal Federal chancelou a forma de aplicação dos novos tetos das EC 20/1998 e 41/2003 estabelecida no voto condutor do acórdão relativo ao referido recurso inominado, que, em suma, deu provimento ao recurso para julgar procedente o pedido do segurado afim de que o salário de benefício seja reajustado pelos índices oficiais até a data da emenda, quando, então, aplica-se o novo teto e os eventuais redutores legais decorrentes da espécie do benefício, contudo, sem gerar diferenças entre a data do início do benefício (DIB) e dezembro de 1998, data da vigência da EC 20/1998, conforme se extrai de trechos do voto e dos debates:
VOTO DA MINISTRA RELATORA CÁRMEN LÚCIA
“(Omissis)
Diversamente do que sustenta a Recorrente, a pretensão que o ora Recorrido sustenta na ação é de manter seus reajustes de acordo com índices oficiais, conforme determinado em lei, sendo possível que, por forças desses reajustes seja ultrapassado o antigo “teto”, respeitando, por óbvio, o novo valor introduzido pela Emenda Constitucional n. 20/98.
10. Sendo essa a pretensão posta em juízo, entendo sem razão a autarquia Recorrente, como bem colocado no voto condutor do acórdão recorrido:
‘O cálculo das prestações pecuniárias previdenciárias de trato continuado é efetivado, em regra, sobre o salário de benefício (Lei nº 8.213/91), e tem como limite máximo o maior valor de salário de contribuição. Assim, após a definição do salário de benefício, calculado sobre o salário de contribuição, deve ser aplicado o limitador dos benefícios da previdência social, a fim de se obter a Renda Mensal do Benefício a que terá direito o segurado. Dessa forma, a conclusão inarredável que se pode chegar é a de que, efetivamente, a aplicação do limitador (teto) para definição da RMB que perceberá o segurado deve ser realizada após a definição do salário de benefício, o qual se mantém inalterado, mesmo que o segurado perceba quantia inferior ao mesmo. Assim, uma vez alterado o valor limite dos benefícios da Previdência Social, o novo valor deve ser aplicado sobre o mesmo salário de benefício calculado quando da sua concessão, com os devidos reajustes legais, a fim de se determinar a nova RMB que passará a perceber o segurado. Não se trata de reajustar e muito menos alterar o benefício. Trata-se, sim, de manter o mesmo salário de benefício calculado quando da concessão do benefício, só que agora lhe aplicando o novo limitador dos benefícios do RGPS’ (fl. 74).
(Omissis)”
VOTO
“(Omissis)
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) – O problema não está nessa diferença, mas está na diferença que resulta do reajuste do cálculo original, isto é, há um cálculo original. Esse cálculo original é reajustado segundo as regras da previdência. O que se pergunta é se, depois de efetuado esse cálculo do reajuste, incido sobre esse valor o redutor?
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (RELATORA) – O mesmo redutor, é só isso.
(Omissis)” (Grifei)
Assim, a forma de cálculo chancelada pelo excelso Supremo Tribunal Federal é a de que a definição da nova renda mensal deve ser feita a partir do salário de benefício não limitado na data do início do benefício (DIB), atualizando-se esse salário de benefício “cheio” pelos índices oficiais de reajustamento até as datas de vigência das EC 20/1998 e 41/2003, e sobre esse valor reajustado aplica-se o novo teto previdenciário estabelecido pelas emendas e, em seguida, os redutores decorrentes da espécie do benefício.
Dos benefícios concedidos anteriormente à Constituição da República de 1988.
Tratando-se de benefício concedido antes da promulgação da Constituição da República (5.10.1988), o colendo Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a aplicabilidade dos limitadores vigentes à época de sua concessão (menor e maior valor teto) na readequação desses benefícios aos novos tetos das EC 20/1998 e 41/2003, decidiu que “Para efeito de adequação dos benefícios previdenciários concedidos antes da Constituição Federal aos tetos das Emendas Constitucionais n. 20/1998 e 41/2003, no cálculo devem-se aplicar os limitadores vigentes à época de sua concessão (menor e maior valor teto), utilizando-se o teto do salário de contribuição estabelecido em cada uma das emendas constitucionais como maior valor teto, e o equivalente à metade daquele salário de contribuição como menor valor teto” (Tema STJ n. 1140).
Os benefícios previdenciários concedidos anteriormente à Constituição da República de 1988 eram calculados, em síntese, da seguinte forma:
a) atualizam-se os salários de contribuição que compõem o cálculo e obtém-se a média, chamada de salário de benefício (SB);
b) faz-se, então, a análise do salário de benefício obtido à luz do menor valor teto (mvt) e do maior valor teto (Mvt), definindo-se a forma de aplicação dos coeficientes e redutores; frise-se que o menor valor teto (mvt) corresponde a metade do maior valor teto (Mvt);
b.1) se o salário de benefício (SB) obtido for inferior ao menor valor teto (mvt), aplica-se sobre ele apenas o coeficiente de cálculo decorrente da espécie do benefício e do tempo de serviço do segurado, resultando na renda mensal inicial;
b.2) se o salário de benefício (SB) obtido for superior ao menor valor teto (mvt), divide-se o salário de benefício (SB) em duas parcelas, sendo a primeira igual ao valor do menor valor teto (mvt) e a segunda parcela correspondente ao valor excedente; sobre a primeira parcela, de forma idêntica à descrita no item “b.1”, aplica-se o coeficiente de cálculo decorrente da espécie do benefício e do tempo de serviço do segurado; sobre o valor da segunda parcela (valor excedente ao mvt), multiplica-se por tantos 1/30 (um trinta avos) quantos sejam os grupos de 12 (doze) contribuições acima do menor valor teto, não podendo esse resultado ser superior a 80% (oitenta por cento) do valor inicial dessa segunda parcela; enfim, somam-se os resultados obtidos pelos cálculos descritos em relação à primeira e segunda parcelas; com exceção às aposentadorias do aeronauta, do ex-combatente e os benefícios concedidos anteriormente a 31.8.1971, frise-se que na eventualidade desse resultado ficar maior que 18 (dezoito) salários mínimos, ou seja, 90% (noventa por cento) do maior valor teto (Mvt), fica ele limitado a esse valor; esse resultado será a renda mensal inicial.
Conforme entendimento que se extrai do voto-condutor, do eminente Ministro Relator Gurgel de Faria, para os benefícios anteriores à Constituição da República, a definição da nova renda mensal deve ser feita a partir do salário de benefício não limitado na data do início do benefício (DIB), atualizando-se esse salário de benefício “cheio” pelos índices oficiais de reajustamento até as datas de vigência das EC 20/1998 e 41/2003, e sobre esse valor reajustado aplica-se o procedimento de cálculo descrito no parágrafo anterior, entendendo como maior valor teto (Mvt) o teto fixado pelas Emendas Constitucionais e o menor valor teto (mvt) a metade do referido teto constitucional.
Dos benefícios concedidos durante o “buraco negro” (5.10.1988 a 5.4.1991).
Para os benefícios concedidos no período chamado “buraco negro”, deve ser utilizado o cálculo da renda mensal inicial revisto administrativamente por força do artigo 144 da Lei n. 8.213/1991.
Conforme exposto anteriormente, para tais benefícios, apura-se o salário de benefício não limitado na data do início do benefício (DIB), atualiza-se esse salário de benefício “cheio” pelos índices oficiais de reajustamento até as datas de vigência das EC 20/1998 e 41/2003, e sobre esse valor reajustado aplica-se o novo teto previdenciário estabelecido pelas emendas e, em seguida, os redutores decorrentes da espécie do benefício.
Da readequação das rendas, da apuração das diferenças e da necessidade de dedução dos valores recebidos.
Importante frisar que, apurando-se rendas mensais maiores que as efetivamente pagas nas competências de vigência das Emendas Constitucionais, a readequação das rendas, após a vigência das referidas Emendas, é medida que se impõe como decorrente da própria ação de conhecimento.
Na apuração das eventuais diferenças devidas devem ser deduzidos, mês a mês, os valores recebidos pelo segurado.
As diferenças devidas devem obedecer ao prazo prescricional quinquenal, a contar da data do ajuizamento da ação revisional, e acrescidas de correção monetária e juros de mora conforme os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, editado pelo Conselho da Justiça Federal.
Do dever geral de boa-fé, probidade e de lealdade processual.
Cabe destacar que o Código de Processo Civil de 2015 erigiu o dever geral de boa-fé ao status de norma fundamental (artigo 5º). Segundo o referido dever, todos que participam do processo devem colaborar para que haja uma solução em tempo razoável, evitando-se o abuso do direito de defesa e as decisões puramente processuais, decorrentes de um formalismo exacerbado, o que se coaduna com a norma do artigo 6º do Diploma processual.
O artigo 77 do Código Processo Civil também impõe o dever de probidade e lealdade processual às partes e seus procuradores, públicos ou privados, assim como a todos aqueles que, de alguma forma, participam do processo.
Nesse contexto, caso a Contadoria judicial constate a ocorrência de equívocos nos cálculos apresentados pelas partes, o total apurado pelo referido setor técnico, em princípio, deve ser acolhido pelo Juízo, em observância ao princípio da lealdade processual, privilegiando-se a substância do julgamento em detrimento da mera formalidade.
Dos cálculos de liquidação, da presunção de veracidade dos cálculos da Contadoria do Juízo e das razões recursais genéricas.
Em regra, nos termos do artigo 509, § 2º, do Código de Processo Civil, a liquidação do julgado pode ser apresentada pelo credor, quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético:
“Art. 509. Quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-se-á à sua liquidação, a requerimento do credor ou do devedor:
(Omissis)
§ 2º Quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença”.
A apuração de crédito de natureza previdenciária, em regra, depende apenas de cálculo aritmético, razão pela qual é plenamente possível o patrono da parte segurada apurar o valor a ela devido, especialmente porque os índices de correção monetária, juros e os critérios de cálculo estão disponibilizados no Manual de Cálculos da Justiça Federal, que pode ser acessado no sítio eletrônico do Conselho da Justiça Federal.
Não obstante a possibilidade de início do cumprimento de sentença pelo credor, o Juízo também pode permitir a chamada execução invertida, hipótese em que o próprio INSS apresenta discriminativo de cálculos.
Além dessas hipóteses, o Juízo pode valer-se da Contadoria do Juízo, nos termos do § 2º, artigo 524, do CPC:
"§ 2º Para a verificação dos cálculos, o juiz poderá valer-se de contabilista do juízo, que terá o prazo máximo de 30 (trinta) dias para efetuá-la, exceto se outro lhe for determinado."
A Contadoria do Juízo é órgão técnico, equidistante das partes, geralmente com acesso aos sistemas de dados de benefícios previdenciários (CNIS, SIBE, entre outros), o que lhe propicia a obtenção das informações necessárias, como valores pagos e salários de contribuição, para a realização de seus cálculos e pareceres, os quais gozam de presunção de veracidade. Dessa forma, a insurgência contra as informações ou os cálculos elaborados pelo mencionado órgão deve ser específica. Com efeito, deve haver indicação dos critérios de fato e de direito que fundamentam essa insurgência.
É importante frisar que, por ocasião da impugnação de cálculo apresentado pelo credor, sob o argumento de excesso de execução, o impugnante deve apontar, de imediato, o valor que entende devido, conforme preceitua o § 2º, artigo 535, do CPC:
"§ 2º Quando se alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante do título, cumprirá à executada declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de não conhecimento da arguição."
De igual forma e por analogia, quando se alega insuficiência de execução, o impugnante também deve discriminar, de imediato, o valor que entende devido ou apontar, especificamente, inconsistências ou erros contidos nos cálculos apresentados.
Destarte, as impugnações e razões recursais genéricas, desacompanhadas de cálculos ou de indicação específica de erros, não têm o condão de afastar a presunção de veracidade dos cálculos da Contadoria do Juízo ou dos cálculos acolhidos pelo Juízo.
Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência desta Corte:
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA DESACOMPANHADA DE VALORES. NÃO CONHECIMENTO. COMPROVANTE DE CITAÇÃO. SUPRIDO PELA CARGA DOS AUTOS.
1. Nos termos do §2º do artigo 535 do Código de Processo Civil, a impugnação do INSS não merece conhecimento, pois desacompanhada dos valores que entende corretos.
(Omissis)".
(TRF/3.ª Região, AI n. 5035038-60.2023.4.03.0000, 10.ª Turma, Relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, DJe 25.3.2024, grifei).
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CÁLCULOS. REDISCUSSÃO. CONTADORIA DO JUÍZO. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE E LEGITIMIDADE NÃO AFASTADA. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA INSUFICIENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.
1.Recurso conhecido, nos termos do parágrafo único, do artigo 1.015, do CPC.
2. O artigo 524, § 2º., do CPC, permite ao juiz se valer do Contador do Juízo para verificação dos cálculos. Isto porque, os cálculos do Contador Judicial têm fé pública e presunção de veracidade, eis que elaborado por pessoa sem relação com a causa e de forma equidistante do interesse das partes.
3. Cabe a Autarquia o ônus de impugnar especificamente os cálculos apurados pela Contadoria do Juízo, indicando os critérios de fato e de direito que fundamentam sua irresignação.
4. A impugnação genérica e sem indicação discriminada do valor devido, é insuficiente para invalidar ou afastar a presunção de veracidade dos cálculos apurados pela Contadoria do Juízo, vez que ao INSS cabe o ônus da produção da contraprova.
5. Agravo de instrumento improvido.
(TRF/3.ª Região, AI n. 5005449-91.2021.4.03.0000, 10.ª Turma, Relator Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA, DJe 1.7.2021, grifei).
PROCESSO CIVIL: AGRAVO LEGAL. EXECUÇÃO. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. LAUDO DO CONTADOR. IMPARCIALIDADE E EQUIDISTÂNCICA DOS INTERESSES DAS PARTES.
I - A certeza e a liquidez dos cálculos elaborados pela Contadoria não podem ser elididas por alegações genéricas que não indicam os equívocos verificados na referida conta.
II - A impugnação dos cálculos tem que ser efetuada de forma analítica, demonstrando, parcela por parcela, as eventuais incorreções.
III - Existindo dúvida quanto aos cálculos apresentado por ambas as partes, pode o julgador se valer do laudo do Contador Judicial, não havendo dúvida quanto a sua imparcialidade e equidistância das partes, devendo o laudo ser prestigiado pelo Juízo.
IV - Agravo improvido.
(TRF/3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 613407 - 0020781-91.1999.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO, julgado em 09/09/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/09/2014, grifei).
AGRAVO LEGAL. APELAÇÃO CÍVEL. JULGAMENTO POR DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 557 DO CPC. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA. CÁLCULOS DO CONTADOR JUDICIAL.
(Omissis)
3. Em sede de execução do julgado, as divergências apontadas pelas partes foram solucionadas pelos cálculos da Contadoria Judicial, elaborados em consonância com o julgado exequendo.
4. Os cálculos elaborados pelo Contador do Juízo observaram o julgado exequendo e, portanto, irreparável a decisão recorrida que os acolhera.
5. O apelante aponta incorretos os valores indicados nos cálculos do Contador Judicial, sem, no entanto, indicar, de forma pormenorizada, os critérios que entendem errôneos outrora adotados pelo "expert".
5. A jurisprudência pátria não permite a adoção de impugnação genérica, sem a precisa indicação do erro cometido pelo expert ou dos fundamentos que ensejariam acolher o quantum pretendido.
6. Agravo legal desprovido.
(TRF/3ª Região, DÉCIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 999199 - 1306662-79.1997.4.03.6108, Rel. JUIZ CONVOCADO VALDECI DOS SANTOS, julgado em 29/09/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/10/2015, grifei).
Do caso dos autos
Conforme anteriormente mencionado, alega a Autarquia que a decisão agravada afastou a correta aplicação dos índices determinados pelo STF no RE/564354-SE. Afirma que ao se aplicar os índices que entende corretos, o agravado não tem direito a revisão do benefício, pois o resultado do cálculo seria de liquidação igual a zero.
Compulsando os autos principais, verifico que a Autarquia (Id 12415609, p. 67, autos n. 0011816-58.2012.4.03.6104), em execução invertida, afirmou não haver valores a serem liquidados, porquanto a RMI do segurado era inferior ao teto. A parte exequente, em seu cálculo de execução (Id 12415609, p. 82-89, autos n. 0011816-58.2012.4.03.6104), apurou a quantia devida de R$ 311.431,93, para janeiro de 2018.
Diante da divergência entre as partes, o Juízo "a quo" encaminhou os autos à Contadoria do Juízo, que, por sua vez, apurou como devida a quantia de R$ 302.942,10 e honorários advocatícios no importe de R$ 42.290,21, totalizando a quantia de R$ 345.232,31, para maio de 2020 (Id 52351798).
Sobreveio a decisão agravada.
Verificando a divergência entre os valores apresentados pelas partes, bem como os valores apresentados pela Contadoria do Juízo "a quo", os autos foram remetidos à Seção de Cálculos deste Tribunal (Id 290902884).
Com retorno dos autos e o parecer da Contadoria desta Corte (Id 301566891, Id 301566894, Id 301566895, Id 301566896), intimadas as partes, vieram os autos conclusos para julgamento.
Em seu parecer, a Contadoria desta Corte esclareceu que as diferenças se dão em razão do modelo (método) empregado na apuração das diferenças. Após detalhada explanação a respeito da aplicação dos métodos a serem utilizados (Id 301566891), a Contadoria desta Corte assim concluiu:
"No caso em tela, a par dos métodos citados receberem influência da trinca normativa administrativa (Portarias nºs 164/92 e 302/92 e OS nº 121/92), até porque, senão, a renda mensal paga de 12/1998 não teria sido de R$ 1.081,46, os resultados oriundos de cada um destoam porque no método de evolução da média e da RMI aproveita-se o excedente no pagamento (em 06/1992) enquanto no de reposição do índice teto aproveita-se o excedente na concessão (em 12/1988).
Desta forma, considerar, exclusivamente, o excedente na concessão em benefício do “buraco negro”, ao que parece, não oportuniza o legado deixado pela repercussão geral em sede de revisão de tetos, a qual, aliás, como visto, s.m.j., estabelece ambas as possibilidades, com isso, o método de evolução da média, ou mesmo da RMI, a par da condição sui generis dos benefícios dessa faixa de DIBs [1ª parte (05/10/1988 a 31/03/1990) e 2ª parte (01/04/1990 a 04/04/1991)], adequa-se ao caso em análise.
Sendo assim, pelo fato do INSS considerar uma média de CZ$ 508.373,80, quer seja, inferior ao limite máximo de CZ$ 511.900,00, bem assim adotar o método de reposição do índice teto, entende inexistirem diferenças em favor do segurado.
Por outro lado, adotando-se o método de evolução da RMI, deferido pelo julgado, bem assim considerando a RMI revisada retificada de CZ$ 482.970,00, atualmente em manutenção, enseja que a execução possa prosseguir com base no cálculo apresentado pela Contadoria Judicial de 1º Grau, cujo valor total foi de R$ 345.232,31 (trezentos e quarenta e cinco mil, duzentos e trinta e dois reais e trinta e um centavos), posicionado em 05/2020".
Conforme se verifica no Id 301566891, Id 301566894, Id 301566895 e Id 301566896, os cálculos elaborados pela Contadoria desta Corte mostram-se em consonância com os cálculos ofertados pela Contadoria Judicial do Juízo "a quo". Dessa forma, a decisão agravada não merece reforma.
Importante mencionar que nos casos em que a Contadoria do Juízo constata a ocorrência de equívocos nos cálculos apresentados pelas partes, o entendimento desta Décima Turma é no sentido de que o total apurado pelo referido setor técnico deve ser acolhido pelo Juízo, em observância ao princípio da lealdade processual, privilegiando-se a substância do julgamento em detrimento da mera formalidade. Outrossim, trata-se de órgão técnico, equidistante das partes, com acesso aos sistemas de dados de benefícios previdenciários, o que lhe propicia a obtenção das informações necessárias, como valores pagos e salários de contribuição, para a realização de seus cálculos e pareceres, os quais gozam de presunção de veracidade e de fé pública.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto, nos termos da fundamentação.
Decorrido o prazo recursal, certifique-se. Após, comunique-se ao juízo de origem e arquivem-se os autos.
Publique-se. Intimem-se".
Em suma, a pretensão da Autarquia não se sustenta nos termos em que a causa foi julgada. As objeções apresentadas no recurso, também no que se refere ao pedido preliminar de suspensão no feito, dizem respeito a benefícios concedidos antes da Constituição da República de 5.10.1988, mas o benefício da parte agravada foi concedido no período denominado "buraco negro", em 9.12.1988. O mesmo se diga quanto aos pedidos subsidiários de anulação da sentença e reabertura da instrução processual, pois de há muito essa fase foi superada já que o processo originário está em fase de cumprimento de sentença.
Por essas razões, e considerando que, no presente recurso de agravo interno, os fundamentos apresentados no recurso estão dissociados da decisão agravada, deve ser mantido o posicionamento adotado.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO INTERNO. REVISÃO DOS TETOS. EC N. 20/1998 E EC N. 41/2003. BENEFÍCIO CONCEDIDO NO DENOMINADO "BURACO NEGRO". POSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Para os benefícios concedidos no período chamado “buraco negro”, deve ser utilizado o cálculo da renda mensal inicial revisto administrativamente por força do artigo 144 da Lei n. 8.213/1991.
2. Para tais benefícios, apura-se o salário de benefício não limitado na data do início do benefício (DIB), atualiza-se esse salário de benefício “cheio” pelos índices oficiais de reajustamento até as datas de vigência das EC 20/1998 e 41/2003, e sobre esse valor reajustado aplica-se o novo teto previdenciário estabelecido pelas emendas e, em seguida, os redutores decorrentes da espécie do benefício.
3. As impugnações e razões recursais genéricas, desacompanhadas de cálculos ou de indicação específica de erros, não têm o condão de afastar a presunção de veracidade dos cálculos da Contadoria do Juízo.
4. Agravo interno não provido.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal