
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5279259-28.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. LOUISE FILGUEIRAS
APELANTE: LUZIA RIBEIRO DA COSTA DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO MARCOS GONCALVES - SP169885-N, APARECIDO ROBERTO DE LIMA - SP165520-N, OTAIL GARCIA DE OLIVEIRA - SP96271-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5279259-28.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. LOUISE FILGUEIRAS
APELANTE: LUZIA RIBEIRO DA COSTA DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO MARCOS GONCALVES - SP169885-N, APARECIDO ROBERTO DE LIMA - SP165520-N, OTAIL GARCIA DE OLIVEIRA - SP96271-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL LOUISE FILGUEIRAS (RELATORA):
Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora, contra a r. decisão monocrática de ID 304866398, que negou provimento ao seu recurso de apelação, mantendo a sentença que julgou improcedente pedido de concessão de prestação continuada à pessoa com deficiência.
Alega o agravante as seguintes matérias: (colocar objetiva e resumidamente cada ponto objeto do agravo)
A) a presença do requisito da deficiência para acesso ao BPC/LOAS.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5279259-28.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. LOUISE FILGUEIRAS
APELANTE: LUZIA RIBEIRO DA COSTA DA SILVA
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO MARCOS GONCALVES - SP169885-N, APARECIDO ROBERTO DE LIMA - SP165520-N, OTAIL GARCIA DE OLIVEIRA - SP96271-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL LOUISE FILGUEIRAS (RELATORA):
Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora, contra a decisão monocrática assim proferida:
"A parte autora ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada à pessoa portadora de deficiência (ID 135936429).
Concedidos os benefícios da Justiça Gratuita (ID 135936439).
Pedido de Tutela Antecipada indeferida (ID 135936439).
Laudo Médico Pericial (ID 135936462) e Estudo Social (ID 135936456) realizados no curso da instrução processual.
O juiz de primeiro grau julgou improcedente o pedido, assim o tópico final da sentença (ID 165878865):
"Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido e resolvo o mérito nos termos
do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, condenando a autora ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da causa, ficando suspensa a execução das verbas sucumbenciais diante dos benefícios da gratuidade processual na forma da lei.
P.I.C."
Apelação interposta pelo parte autora (ID 165878869) sustentando que estão presentes os requisitos para a concessão do benefício, em especial, a deficiência.
Sem contrarrazões, subiram os autos para este E. Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso (ID 303644823).
É O RELATÓRIO.
DECIDO.
Cabível o julgamento monocrático deste apelo, nos termos do artigo 932 do Código de Processo Civil de 2015, em atenção aos princípios constitucionais da celeridade e razoável duração do processo, haja vista o entendimento dominante sobre o tema em questão (Súmula 568/STJ, aplicada por analogia).
O recurso de apelação preenche os requisitos normativos de admissibilidade e, portanto, é conhecido.
A controvérsia havida no presente feito cinge-se à análise do implemento dos requisitos legais necessários a garantir à parte autora o recebimento de benefício assistencial de prestação continuada.
1. DOS CRITÉRIOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência econômica em que se encontram, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Nesse aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, inciso V, da Constituição da República, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei."
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei n.º 8.742/1993, com redação dada pela Lei n.º 14.176, de 22 de junho de 2021, e o artigo 34, parágrafo único, da Lei n.º 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), com redação dada pela Lei n.º 14.423, de 22 de julho de 2022, rezam:
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 3º Observados os demais critérios de elegibilidade definidos nesta Lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput deste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo."
(...)
"Art. 34. Às pessoas idosas, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário mínimo, nos termos da Loas.
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
O apontado dispositivo legal, artigo 20, § 3º, da Lei n.º 8.742/93, se aplicável ao idoso, resulta numa forma de limitação do mandamento constitucional, pois conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda igual ou inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, e por força do artigo 34 da Lei nº 10.741/2003, excluindo-se a renda daquele que já recebe o benefício de prestação continuada.
A interpretação deste último dispositivo legal (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei n.º 8.742/93.
Ressalte-se ainda, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto n.º 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o artigo 4º, inciso VI e o artigo 19, caput e parágrafo único do referido decreto:
"Art. 4º Para fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19."
(...)
"Art 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família."
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei n.º 8.742/1993 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada improcedente. Além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, proposta pelo INSS, o acórdão do STF restou assim ementado, publicado no DJ de 1º.4.2005, páginas 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie:
"RECLAMAÇÃO. SALÁRIO MÍNIMO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA E IDOSO. ART. 203. CF.
- A sentença impugnada ao adotar a fundamentação defendida no voto vencido afronta o voto vencedor e assim a própria decisão final da ADI 1.232. Reclamação procedente."
O resultado desse julgamento significou afirmar que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensável elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante igual ou inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
Porém, o critério não é excludente de outras considerações acerca da hipossuficiência econômica que dá azo ao BPC no caso concreto, nem das prescrições do Estatuto do Idoso, quanto à renda de um salário mínimo que é devida ao maior de 65 anos em caso de não ter meios de prover a própria subsistência ou tê-la provida por familiares.
É fato que esta 8ª Turma tem decidido que referido critério - montante igual ou inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo - não é o único para aferir a HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA que legitima a concessão do benefício, vendo-se de trechos de acórdãos da lavra da Desembargadora Federal Therezinha Cazerta e do Desembargador Federal Toru Yamamoto o seguinte:
"Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20, 3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos comprovados nos autos."
(Apelação Cível n.º 5002154-51.2023.4.03.9999, rel. Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, julgamento 28.6.2023)
(...)
"2. No que diz respeito ao requisito socioeconômico, ainda que o parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, com redação dada pela Lei 14.176/2021, considere como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, fato é que a jurisprudência entende bastante razoável a adoção de ½ (meio) salário-mínimo como parâmetro, eis que os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário-mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios, adotado pelo Programa Nacional de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03); Programa Bolsa Família - PBF (Lei n.º 10.836/04); Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa Escola (Lei 10.219/2001); Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa Alimentação (MP 2.206-1/2001); Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002); e Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001)."
(Apelação Cível n.º 5071229-80.2023.4.03.9999, rel. Desembargadora Federal Toru Yamamoto, julgamento 27.11.2023)
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à DEFICIÊNCIA, dispõe o § 2º do artigo 20 da Lei n.º 8.742/1993:
"§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
A Lei n.º 8.742/1993 diferenciou o conceito de deficiência da incapacidade para o trabalho, considerando "pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas".
É dizer, o requisito da deficiência recebeu, com a legislação, para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada, exigência menor quando em confronto com a incapacidade para o trabalho.
Pessoa com deficiência, pois, para o fim de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, é aquela que tem impedimento de longo prazo, consideradas as barreiras que enfrenta em seu contexto específico de vida.
1.1 DAS EXCLUSÕES DE VALORES DO CÁLCULO DA RENDA MENSAL PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR DECORRENTES DE LEI
Da prescrição do artigo 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, transcrito acima, resulta que a interpretação do requisito da hipossuficiência econômica necessário para a configuração do direito ao Benefício de Prestação Continuada nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, resulta na necessidade de se excluir, do cômputo da renda mensal familiar o valor de um salário mínimo recebido a título deste benefício, ou de outro, ou do mesmo valor em termos de renda de qualquer natureza, inferindo-se disso que o idoso ou pessoa com deficiência que não tenha meios de prover a sua subsistência ou tê-la provida pelo seu núcleo familiar deve ter garantido pelo Estado, de modo personalíssimo, o acesso ao mínimo necessário para a subsistência, ou seja, pelo menos um salário mínimo por mês.
Segundo declarou em seu voto o E. Ministro Benedito Gonçalves no REsp n. 1.355.052/SP, alçado a sistemática dos recursos repetitivos, referindo-se à exclusão de renda determinada no artigo 34 do Estatuto do Idoso:
"O normativo informa que o valor recebido por idoso, a partir dos 65 anos de idade e a título de benefício de prestação continuada, não deve fazer parte da renda da família de que trata o artigo 20, § 3º, do da Lei n. 8.742/93. É dizer, o idoso que completa 65 anos de idade e não provê a sua subsistência ou não a tem provida com o auxílio da família não deve compor a dimensão econômica do núcleo familiar quando em análise a concessão de outro benefício assistencial a idoso. E isso se deve porque a renda mínima que ele recebe é personalíssima e se presta, exclusivamente, à sua manutenção, protegendo-o da situação de vulnerabilidade social. Assim, a proteção aos idosos aqui tem nítido caráter assistencial. Ora, não há distinção constitucional entre vulneráveis (idosos e deficientes) e não há norma na Lei Orgânica da Assistência Social a garantir às pessoas com deficiência o mesmo amparo que o parágrafo único do artigo 34 da Lei n. 10.741/03 garante aos idosos." (grifei).
Eis a ementa do acórdão, de cujo voto condutor se extraiu o excerto acima:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se:
Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008."
(REsp n. 1.355.052/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25.2.2015, DJe de 5.11.2015)
No julgamento acima citado firmou-se o TEMA 640, na sistemática dos recursos repetitivos:
"Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93."
Nesse sentido, ainda, da fungibilidade dos benefícios para fins desta exclusão e da tese do valor mínimo reservado ao idoso ou deficiente, a partir da sua vulnerabilidade social, confira-se a ementa do RE 580.963/PR, submetido ao regime da repercussão geral, em que o Pretório Excelso declarou inconstitucional por omissão o parágrafo único do Art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), na medida em que deixou de contemplar outras situações de igual vulnerabilidade a dos idosos, como a dos deficientes, bem como pela restrição relativa a exclusão de outras formas de renda, como benefícios previdenciários recebidos no valor de um salário mínimo por componentes do núcleo familiar na exclusão prevista no citado dispositivo legal:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que: 'considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo'. O requisito financeiro estabelecido pela Lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a Lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.” (grifei).
(RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18.4.2013, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13.11.2013 PUBLIC 14.11.2013)
Portanto, nos é dado concluir que o benefício mensal de um salário mínimo, recebido por qualquer membro da família, como única fonte de recursos, não afasta a condição de hipossuficiência econômica do núcleo familiar para os fins do BPC/LOAS, quando nele se inclua pessoa idosa ou com deficiência. Seria um evidente contrassenso se entender que o benefício mensal de um salário mínimo, na forma da LOAS, recebido por um membro da família, não impede a concessão de igual benefício a outro membro, ao passo que a concessão de aposentadoria por idade, por exemplo, no valor de um salário mínimo, nas mesmas condições, seria obstáculo à concessão de benefício assistencial.
Além disso, fixada essa premissa, dela decorre necessariamente que qualquer renda de um salário mínimo, percebida por um membro da família, independentemente da origem da receita, não poderá ser impedimento para que outro membro, cumprindo os demais requisitos exigidos pela Lei nº 8.742/93, aufira o benefício assistencial, pois a condição econômica para a subsistência é exatamente igual àquela situação de que trata o parágrafo único do artigo 34 da Lei nº 10.741/2003.
Além disso, reitere-se, a regra não pode deixar de ser aplicada no caso do deficiente ou do "incapaz para a vida independente e para o trabalho”, porquanto economicamente não se pode dizer que são situações distintas.
1.2. DA AMPLIAÇÃO DO CRITÉRIO DE AFERIÇÃO DA RENDA FAMILIAR MENSAL
O artigo 20-B, incisos I a III e §§ 1º a 3º da Lei n.º 8.742/1993:
"Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita de que trata o § 11-A do referido artigo:. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
I – o grau da deficiência;. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 1º A ampliação de que trata o caput deste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III do caput deste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III do caput deste artigo.. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021) (Vigência)
§ 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I do caput deste artigo será aferido por meio de instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do art. 40-B desta Lei."
Vale dizer, ao lado do critério de cálculo da renda por indivíduo, para fins de aferição da vulnerabilidade econômica também são considerados o grau da deficiência, a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária e o comprometimento do orçamento do núcleo familiar, aí em conta despesas "com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida".
No juízo do Superior Tribunal de Justiça ao firmar a seguinte tese no Tema Repetitivo 185: "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo." (STJ, REsp n.º 1.112.557/MG, Terceira Seção, relator o Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 28.10.2009, acórdão publicado em 20.11.2009).
Ementa e acórdão assim redigidos:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Felix Fischer, Arnaldo Esteves Lima e Maria Thereza de Assis Moura.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Nilson Naves.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Laurita Vaz."
2. DO CASO CONCRETO
No que se refere aos requisitos legais necessários a garantir à parte autora o recebimento assistencial de prestação continuada, o exame será unicamente da condição de deficiência, não se questionando, na apelação interposta pela parte autora, a condição de hipossuficiência, já reconhecida em sentença.
O laudo médico pericial (ID 135936462), conforme exame realizado em 23/10/2019, revela que a parte autora, com 56 anos de idade à época da perícia, foi diagnosticada com transtorno dissociativo-conversivo (CID 10-F44.7).
A perícia médica apurou pela inexistência de deficiência, sob ponto de vista médico psiquiátrico, que acarrete impedimento ou restrição relevante de participação e interação da parte autora com o seu ambiente físico, social e familiar nas demais dimensões da sua vida cotidiana e atividades compatíveis com sua idade.
No exame psíquico realizado por ocasião da perícia médica, a autora apresentou-se atenta, orientada globalmente, com memória preservada. Postura fragilizada, vitimizada, com sinais de baixo limiar para lidar com frustração. Fala de conteúdo lógico, de velocidade normal. Relata alteração do sensopercepção não convincente tecnicamente. Humor levemente deprimido, afeto superficial. Juízo crítico da realidade preservado.
Do laudo médico, a conclusão:
"Após avaliação da história clínica, exame psíquico, e cuidadosa leitura e análise da documentação médica inclusa aos autos, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, a Periciada Luzia Ribeiro da Costa da Silva encontra-se CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laboral incluindo a habitual e/ou de exercer os atos da vida civil."
Assim, considerando que os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada devem ser cumulativos, ausente a deficiência deve ser mantida a r. sentença que julgou improcedente o pedido, sem embargo de que seja realizado novo pedido administrativo em caso de agravamento da patologia psiquiátrica.
Dispositivo
Posto isso, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, mantendo, na íntegra, a sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial de prestação continuada.
Em razão da sucumbência recursal, mantenho a condenação da parte autora em custas e despesas processuais e majoro os honorários advocatícios fixados na r. sentença em 2% (dois por cento), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 4º, III, 5º, 11, do CPC/2015 e o regime jurídico da assistência judiciária gratuita.
Decorrido o prazo recursal, tornem os autos ao Juízo de origem.
Intimem-se. Publique-se."
A impugnação neste agravo interno versa sobre as seguintes matérias:
A) Requisito da deficiência para fins de acesso ao BPC/LOAS.
Sustenta a parte autora/recorrente que não reúne condições para o trabalho, devendo ser considerada incapacitada para o trabalho de forma total e permanente, considerando que o tratamento é por tempo indeterminado e que sempre exerceu atividades que demandam esforço físicos, além do baixo grau de instrução que possui, tendo estudado apenas até a 3ª série do antigo primário.
Sobre o item a, a decisão assim dispôs:
"O laudo médico pericial (ID 135936462), conforme exame realizado em 23/10/2019, revela que a parte autora, com 56 anos de idade à época da perícia, foi diagnosticada com transtorno dissociativo-conversivo (CID 10-F44.7).
A perícia médica apurou pela inexistência de deficiência, sob ponto de vista médico psiquiátrico, que acarrete impedimento ou restrição relevante de participação e interação da parte autora com o seu ambiente físico, social e familiar nas demais dimensões da sua vida cotidiana e atividades compatíveis com sua idade.
No exame psíquico realizado por ocasião da perícia médica, a autora apresentou-se atenta, orientada globalmente, com memória preservada. Postura fragilizada, vitimizada, com sinais de baixo limiar para lidar com frustração. Fala de conteúdo lógico, de velocidade normal. Relata alteração do sensopercepção não convincente tecnicamente. Humor levemente deprimido, afeto superficial. Juízo crítico da realidade preservado.
Do laudo médico, a conclusão:
"Após avaliação da história clínica, exame psíquico, e cuidadosa leitura e análise da documentação médica inclusa aos autos, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, a Periciada Luzia Ribeiro da Costa da Silva encontra-se CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laboral incluindo a habitual e/ou de exercer os atos da vida civil."
Assim, considerando que os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada devem ser cumulativos, ausente a deficiência deve ser mantida a r. sentença que julgou improcedente o pedido, sem embargo de que seja realizado novo pedido administrativo em caso de agravamento da patologia psiquiátrica."
Reitera-se o quanto ali disposto, eis que ausente o requisito da deficiência para fins de acesso ao beneficio, objeto dos autos.
Frise-se que o conceito de pessoa com deficiência, para fins de acesso ao benefício assistencial de prestação continuada, é aquela que possui impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
No presente caso, a perícia médica (ID 135936462) foi clara e enfática ao concluir que a autora encontra-se CAPAZ de exercer toda e qualquer atividade laboral incluindo a habitual e/ou de exercer os atos da vida civil, não restando evidenciado, assim, qualquer impedimento, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir a sua participação de forma plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Verifica-se, assim, que todos os argumentos ventilados nas razões recursais foram enfrentados pela decisão monocrática, razão pela qual não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida.
Dessa forma, a reiteração que se faz da essência das afirmações expostas na decisão agravada, suficientes ao deslinde da causa, não configura violação ao art. 1.021, § 3º, do CPC/2015, haja vista que esse dispositivo, interpretado em conjunto com o seu §1º, não impõe ao julgador, em sede de agravo interno, o dever de refazer o texto do decisum com os mesmos fundamentos, porém em palavras distintas, quando inexistentes novas (e relevantes) teses recursais. Nesse diapasão, há jurisprudência:
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 1021, § 3º, DO CPC. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 489 E 1.022 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. No caso em apreço, conforme se extrai do acórdão recorrido, cuida-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro tendo em vista a contratação direta pelo Município de Paracambi da sociedade empresária DESK IMÓVEIS ESCOLARES E PRODUTOS PLÁSTICOS LTDA, da qual os demais réus são sócios. Em primeira instância, a petição inicial foi recebida e, interposta apelação pelos réus, o Tribunal local negou provimento ao recurso.
2. O Colegiado do Tribunal de origem, ao analisar o agravo interno interposto contra decisão monocrática, consignou que, nas razões do agravo interno, não foi elencado nenhum argumento novo apto a modificar a questão submetida ao Tribunal. O entendimento do STJ é no sentido de que a vedação do artigo 1.021, §3, do CPC, não pode ser compreendida como uma obrigatoriedade de se refazer o texto do decisum com os mesmos fundamentos, porém em palavras distintas, mesmo diante de inexistência de uma nova tese apresentada pela agravante no recurso.
3. A Corte local apreciou expressamente a alegação de existência de vício de fundamentação na decisão de primeira instância que recebeu a inicial, consignando que foram apresentados indícios suficientes das condutas narradas na inicial e que, na presente fase processual, prevalece o princípio do in dubio pro societate, uma vez que o magistrado não deve restringir a possibilidade de êxito do autor de provar, durante o processo, o alegado na inicial. Assim, não se pode dizer que a decisão da Corte local é desprovida de fundamentação. Ademais, a solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao artigo 1.022 do CPC/2015, pois não há que se confundir decisão contrária aos interesses da parte com negativa de prestação jurisdicional.
4. Agravo interno não provido”.
(AgInt no AREsp 1745951/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 29/03/2021, DJe 07/04/2021)
“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATAÇÃO A TÍTULO PRECÁRIO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015 (ART. 535 DO CPC/73). INEXISTÊNCIA. ANÁLISE QUANTO A REGULARIDADE DE CONTRATO FIRMADO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7 DO STJ. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PRECEDENTES.
[...]
IV - Quanto à apontada violação ao art. 1.021, § 3º, do CPC/2015, é de rigor destacar que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar o mencionado comando legal, assentou que o dispositivo não impõe ao julgador a obrigação de reformular a decisão agravada para, em outros termos, reiterar os seus fundamentos, notadamente diante da falta de argumento novo deduzido pela parte recorrente. Assim, não há que ser reconhecido nenhum vício no julgado recorrido. Nesse sentido: AgInt nos EDcl no REsp 1712330/MG, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 16/08/2018, DJe 20/09/2018.
[...]
VII - Agravo interno improvido”.
(AgInt no AREsp 1703571/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 15/03/2021)
“AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO. ART. 1.021, § 3º DO NCPC. REITERAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
- A vedação insculpida no art. 1.021, §3º do CPC/15 contrapõe-se ao dever processual estabelecido no §1º do mesmo dispositivo.
- Se a parte agravante apenas reitera os argumentos ofertados na peça anterior, sem atacar com objetividade e clareza os pontos trazidos na decisão que ora se objurga, com fundamentos novos e capazes de infirmar a conclusão ali manifestada, decerto não há que se falar em dever do julgador de trazer novéis razões para rebater alegações genéricas ou repetidas, que já foram amplamente discutidas.
- Agravo interno desprovido”.
(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002514-38.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, julgado em 25/03/2021, Intimação via sistema DATA: 05/04/2021)
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO INTERNO DA PARTE AUTORA. MANUTENÇÃO DO JULGADO AGRAVADO. AGRAVO DESPROVIDO.
- Inviabilidade do agravo interno quando constatada, de plano, a improcedência da pretensão recursal, mantidos os fundamentos de fato e de direito do julgamento monocrático, que bem aplicou o direito à espécie.
- Agravo interno desprovido.”
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5299971-39.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 21/03/2022, Intimação via sistema DATA: 25/03/2022)
Impõe-se, portanto, a manutenção da decisão agravada, também pelos respectivos e apropriados fundamentos.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno da parte autora.
É como voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO EM AÇÃO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (BPC/LOAS). AUSÊNCIA DO REQUISITO DA DEFICIÊNCIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
-
Agravo interno interposto contra decisão monocrática que julgou improcedente pedido de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), ao fundamento de inexistência de deficiência que impeça a parte autora, diagnosticada com transtorno dissociativo-conversivo (CID 10-F44.7), de exercer atividade laboral. A recorrente sustenta incapacidade total e permanente para o trabalho, considerando seu histórico ocupacional, baixa escolaridade e necessidade de tratamento por tempo indeterminado.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
-
A questão em discussão consiste em definir se estão presentes os requisitos legais, notadamente o da deficiência, para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada (BPC/LOAS), à luz do laudo médico-pericial acostado aos autos.
III. RAZÕES DE DECIDIR
-
A concessão do BPC exige a presença cumulativa dos requisitos de hipossuficiência econômica e deficiência, entendida como impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que, em interação com barreiras, obstrua a participação plena e efetiva do indivíduo na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
-
A perícia médica realizada conclui, com base na avaliação da história clínica, exame psíquico e documentação apresentada, que a autora está apta ao exercício de qualquer atividade laboral, não apresentando limitação funcional que configure deficiência nos termos legais.
-
O agravo interno limita-se a reproduzir argumentos já analisados na decisão monocrática, sem apresentar fundamentos novos aptos a modificar o entendimento adotado, razão pela qual não há obrigação do julgador de reformular os fundamentos anteriormente expostos, nos termos do art. 1.021, § 3º, do CPC/2015.
-
A jurisprudência do STJ e dos Tribunais Regionais Federais é pacífica ao reconhecer que a mera reiteração de argumentos já enfrentados não enseja nova fundamentação, sendo legítima a manutenção da decisão agravada nos próprios fundamentos.
IV. DISPOSITIVO E TESE
-
Recurso desprovido.
Tese de julgamento:
-
A ausência de impedimento funcional de longo prazo, conforme constatado por perícia médica, afasta o requisito de deficiência necessário à concessão do BPC/LOAS.
-
A reiteração de argumentos já enfrentados em decisão monocrática não impõe ao julgador o dever de reapresentar os fundamentos em novas palavras, nos termos do art. 1.021, § 3º, do CPC/2015.
-
A improcedência do pedido é mantida quando não demonstrada incapacidade laboral nem barreiras que impeçam a participação plena e efetiva da parte na sociedade.
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.742/1993, art. 20, § 2º; CPC/2015, art. 1.021, § 3º.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, AgInt no AREsp 1745951/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 29.03.2021, DJe 07.04.2021;
STJ, AgInt no AREsp 1703571/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, j. 01.03.2021, DJe 15.03.2021;
TRF3, ApCiv 5002514-38.2017.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Luiz Alberto de Souza Ribeiro, j. 25.03.2021;
TRF3, ApCiv 5299971-39.2020.4.03.9999, Rel. Des. Fed. David Diniz Dantas, j. 21.03.2022.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal