
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5062276-59.2025.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: ANTONIO ROZENDO RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5062276-59.2025.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: ANTONIO ROZENDO RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta por Antonio Rozendo Rodrigues contra sentença que julgou procedente o pedido inicial de condenar o INSS a conceder o benefício de incapacidade temporária desde o requerimento administrativo, 10/08/2022, até a comprovação da reabilitação profissional da parte autora. Foi deferida tutela para implantação de benefício.
Em suas razões recursais, a parte autora alega preliminarmente cerceamento de defesa em razão da não observância do princípio do contraditório e ampla defesa, bem como a nulidade do laudo pericial visto que o perito não é especialista na área de cardiologia. Argumenta que em razão da atividade laborativa, idade e patologia do autor é necessária a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente. Aduz que os honorários advocatícios devem ser majorados. Assim, requer o reconhecimento da nulidade da sentença e a realização de nova perícia judicial ou que o perito preste esclarecimentos e que seja implantado a aposentadoria por incapacidade permanente desde a cessação ou requerimento administrativo e prequestiona a matéria para fins recursais.
Sem apresentação de contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5062276-59.2025.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: ANTONIO ROZENDO RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Da preliminar de cerceamento de defesa
Não procede o pedido de cerceamento de defesa em razão do laudo judicial ter sido realizado por médico não especializado.
Com efeito, é sabido que a prova tem como destinatário o magistrado, a quem cabe avaliar quanto à sua suficiência, necessidade e relevância, não constituindo cerceamento de defesa o indeferimento de prova considerada inútil ou protelatória.
A respeito, prescreve o artigo 370 do Código de Processo Civil que ao juiz é dado decidir acerca das provas que julga necessárias ao deslinde de mérito do processo, in verbis:
Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.
No caso concreto, observo que o laudo pericial (ID 322723666) é suficientemente fundamentado, tendo, inclusive, analisado os documentos médicos trazidos aos autos pela parte autora, e identificado sua incapacidade de modo que não se faz necessária a realização de nova perícia.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE INCAPACIDADE. REQUISITOS LEGAIS AUSENTES. PEDIDO DE REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA. INCABÍVEL.
- O auxílio por incapacidade temporária, nova denominação do auxílio-doença, encontra-se previsto nos artigos 59 a 63 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991 e destina-se aos segurados da Previdência Social que estejam em situação de temporária incapacidade para o trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, decorrente de doença, acidente de qualquer natureza ou por prescrição médica, constatada a possibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
- A concessão da aposentadoria por incapacidade total e permanente (aposentadoria por invalidez), regulamentada pelo artigo 43, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
- Decorre do laudo técnico que não foi constatada a incapacidade laboral da parte autora.
- De outro giro, cumpre salientar que cabe ao magistrado, no uso de seu poder instrutório, avaliar a suficiência da prova produzida para desenvolver seu livre convencimento. A respeito, vejam-se os artigos 370 e 371 do CPC.
- Com efeito, caso tenha sido considerado que o laudo pericial elaborado por perita judicial - profissional qualificado equidistante das partes – contém elementos suficientes para a devida análise da alegada incapacidade da parte autora, desnecessária a realização de nova perícia com médico especialista para cada moléstia apresentada pela parte.
- Nesse contexto, não se identifica excepcionalidade a demandar realização de nova perícia com médico especialista, pois da análise do laudo pericial, observa-se que este foi conduzido de maneira satisfatória. Nota-se que a expert analisou as enfermidades alegadas por meio de exames realizados diretamente e pela aferição de documentação médica, sendo conclusivo acerca da ausência de incapacidade laborativa.
- Em atenção aos argumentos da parte autora, cumpre observar que não é a doença, por si só, que gera o direito à obtenção dos benefícios previdenciários, e sim a presença do pressuposto da incapacidade laborativa, provisória ou definitiva, ausente na espécie.
- Acrescente-se, por fim, que os benefícios previdenciários decorrentes de incapacidade são regidos pela cláusula "rebus sic stantibus", de modo que, havendo agravamento da moléstia ou alteração do quadro de saúde da parte autora, pode ela postular administrativamente a concessão de novo benefício.
- Apelação não provida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004398-50.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 25/10/2023, DJEN DATA: 27/10/2023)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. BENEFICIO NÃO CONCEDIDO. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA IMPROVIDA.
1. Rejeito a matéria preliminar arguida pela autora, uma vez que não há necessidade de realização de nova perícia. No presente caso, a peça técnica, na falta óbvia de conhecimento técnico em medicina por parte do juiz, assume grande importância na discussão de viabilidade do pedido. Oportuno observar que o laudo pericial constante dos autos traz elementos suficientes ao deslinde da demanda, função precípua da prova pericial. Cabe ressaltar ainda que a perícia foi realizada por profissional de confiança do Juízo, dotado de conhecimentos técnicos para realizar perícia médica, verificando as patologias alegadas na inicial.
2. A concessão de aposentadoria por invalidez reclama que o requerente seja segurado da Previdência Social, tenha cumprido o período de carência de 12 (doze) contribuições, e esteja incapacitado, total e definitivamente, ao trabalho (art. 201, I, da CR/88 e arts. 18, I, "a"; 25, I e 42 da Lei nº 8.213/91). Idênticos requisitos são exigidos à outorga de auxílio-doença, cuja diferença centra-se na duração da incapacidade (arts. 25, I, e 59 da Lei nº 8.213/91).
3. Cabe lembrar que o indivíduo pode padecer de determinada patologia e, ainda assim, deter capacidade para a execução de atividades laborativas, ainda que para funções não equivalentes às suas habituais.
4. Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora improvida.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004073-88.2021.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 07/09/2022, DJEN DATA: 13/09/2022)
Tendo em vista os princípios do contraditório e da ampla defesa, considera-se suficiente a prova produzida e afastado o argumento de cerceamento de defesa.
Do mérito
Superada a questão preliminar, necessário abordar o tema dos benefícios previdenciários por incapacidade para o trabalho.
Prefacialmente, necessário abordar o tema dos benefícios previdenciários por incapacidade para o trabalho.
A redação original do artigo 201, I, da Constituição Federal estabelecia que os regimes de previdência abrangeriam a cobertura de eventos como invalidez e doença, entre outros. Com a Emenda Constitucional 103, de 13 de novembro de 2019, o texto constitucional adotou uma nova terminologia para designar os eventos cobertos pela previdência, referindo-se às contingências de incapacidade permanente ou temporária, anteriormente denominadas invalidez ou doença, conforme a nova redação do artigo 201, I, da CF:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019) I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019).
Observando o princípio tempus regit actum, a concessão dos benefícios por incapacidade deve seguir os requisitos previstos na legislação vigente à época.
A aposentadoria por incapacidade permanente (invalidez) está prevista nos artigos 42 a 47 da Lei 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social – LBPS), bem como nos artigos 43 a 50 do Decreto 3.048, de 6 de maio de 1999 (Regulamento da Previdência Social – RPS), com suas alterações, sempre em conformidade com as mudanças trazidas pela EC 103/2019. Por oportuno, confira-se o caput do artigo 42 da LBPS
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
O respectivo benefício de aposentadoria é destinado aos segurados da Previdência Social cuja incapacidade para o trabalho seja considerada permanente e sem possibilidade de recuperação da capacidade laboral, ou de reabilitação para o exercício de atividades que assegurem sua subsistência.
Embora a aposentadoria por incapacidade permanente não tenha caráter vitalício, o benefício torna-se definitivo quando, após não ser constatada a possibilidade de reabilitação profissional, o segurado é dispensado de realizar perícias médicas periódicas. Essa situação ocorre quando o segurado: I) completa 55 (cinquenta e cinco) anos de idade e tenham decorridos 15 (quinze) anos de gozo da aposentadoria por incapacidade e/ou auxílio por incapacidade provisória; ou II) implementa os 60 (sessenta) anos de idade, conforme preceitua o artigo 101, I e II, da LBPS, com as alterações da Lei 13.457/2017.
Por sua vez, o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) está previsto nos artigos 59 a 63 da LBPS e sua regulamentação disposta nos artigos 71 a 80 do RPS, sendo que a premissa básica para concessão se encontra no caput do artigo 59 da LBPS:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando foro caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalhou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
O benefício é destinado aos segurados da Previdência Social que estejam temporariamente incapacitados para o trabalho ou sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, em razão de doença, acidente de qualquer natureza ou por prescrição médica, desde que constatada a possibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que lhes garanta a subsistência.
Por sua natureza temporária, o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) pode, posteriormente, ser: (I) transformado em aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez), caso se constate incapacidade total e permanente; (II) convertido em auxílio-acidente, se houver comprovação de sequela permanente que reduza a capacidade laboral; ou (III) cessado, em razão da recuperação da capacidade laboral com retorno ao trabalho, ou devido à reabilitação profissional.
Ainda, necessário enfatizar, no caso de auxílio-doença, da necessidade de reabilitação profissional, em que a Constituição Federal, prevê no seu artigo 203, IV, o asseguramento do respectivo direito, o incluindo entre os objetivos da assistência social. Outrossim, a Lei 8.213/1991, aborda a habilitação e reabilitação nos artigos 18, inciso III, letra “c”, 26, inciso V, 62 e 89 a 93.
Essas disposições legais são regulamentadas pelos artigos 77 e 136 a 141 do Decreto 3.048/1999, e suas alterações subsequentes, bem como pelos artigos 415 a 423 da IN INSS 128/2022.
O INSS é responsável por fornecer o serviço de reabilitação profissional aos segurados que estão incapacitados para o trabalho devido a doença ou acidente, com o objetivo de prepará-los para retornar ao mercado de trabalho.
Durante o processo de reabilitação profissional, o segurado que não pode exercer sua atividade original continuará recebendo o benefício de auxílio de incapacidade temporária (auxílio-doença) até que esteja apto para uma nova função ou, em caso de incapacidade total e permanente, receba a aposentadoria por incapacidade permanente.
Além disso, quanto ao efetivo início da reabilitação profissional, a Súmula 177/TNU estabelece:
Constatada a existência de incapacidade parcial e permanente, não sendo o caso de aplicação da Súmula 47 da TNU, a decisão judicial poderá determinar o encaminhamento do segurado para análise administrativa de elegibilidade à reabilitação profissional, sendo inviável a condenação prévia à concessão de aposentadoria por invalidez condicionada ao insucesso da reabilitação; 2. A análise administrativa da elegibilidade à reabilitação profissional deverá adotar como premissa a conclusão da decisão judicial sobre a existência de incapacidade parcial e permanente, ressalvada a possibilidade de constatação de modificação das circunstâncias fáticas após a sentença” (julgado em 21 de fevereiro de 2019, publicado em 26 de fevereiro de 2019).
Dessa forma, nos casos em que o segurado é amparado pelo benefício de auxílio-doença e existe a possibilidade de uma eventual aposentadoria por invalidez, deve-se primeiro proceder à verificação administrativa da viabilidade de reabilitação.
Assim, superadas as distinções assinaladas, analisam-se os requisitos para a concessão do benefício por incapacidade, sendo basicamente três: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento da carência, quando aplicável; e 3) a comprovação da incapacidade laborativa.
O primeiro requisito é a qualidade de segurado, conforme o artigo 11 da LBPS, cuja manutenção tem como fundamento principal o pagamento de contribuições ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Dessa forma, considerando o caráter contributivo da Previdência Social, a qualidade de segurado será mantida mediante a regular contribuição. No entanto, a LBPS prevê uma exceção expressa por meio do denominado período de graça, que consiste no intervalo em que, mesmo sem o recolhimento de contribuições, o indivíduo mantém a condição de segurado, conforme as situações previstas no artigo 15 da mesma lei.
O segundo requisito (carência) para a obtenção de benefícios por incapacidade, como regra geral, exige a comprovação do pagamento de 12 (doze) contribuições mensais, conforme o artigo 25 da LBPS. A carência é definida como o "número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário tenha direito ao benefício, contadas a partir do primeiro dia dos meses de suas competências", conforme o caput do artigo 24 da LBPS.
Entretanto, necessário mencionar, existem hipóteses previstas em que a concessão do benefício independe de carência, como nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa, doença profissional ou do trabalho, bem como para o segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por doenças listadas nos artigos 26, inciso II, e 151 da LBPS.
Por fim, no que diz respeito ao terceiro requisito para a obtenção da aposentadoria, que é a incapacidade para o trabalho, esta deve ser permanente e irreversível, sem possibilidade de recuperação ou reabilitação para outra atividade que assegure a subsistência (aposentadoria por invalidez). Já para o auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença), a incapacidade deve persistir por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Ressalta-se que, para a avaliação da incapacidade, é necessário demonstrar que, no momento da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto quando a incapacidade for resultante da progressão ou agravamento da doença ou lesão, conforme estabelecido nos artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da LBPS:
Art. 42. (...) § 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
(...)
Art. 59. (...) § 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019).
A identificação de incapacidade, seja total ou parcial, é feita por meio de perícia médica conduzida por perito designado pelo Juízo, conforme estabelecido no Código de Processo Civil. No entanto, importante ressaltar, o juiz não está restrito apenas às conclusões da perícia, podendo considerar outros elementos presentes nos autos para formar sua convicção, como aspectos pessoais, sociais e profissionais do segurado.
Oportuno registrar alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que tratam desse assunto:
Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez.
Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social.
Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
Ainda, é possível extrair do artigo 43, § 1º, da LBPS, que a concessão da aposentadoria por invalidez depende da comprovação de incapacidade total e permanente para o trabalho, por meio de exame médico-pericial realizado pela Previdência Social. A jurisprudência consolidou o entendimento de que a incapacidade parcial e permanente para o trabalho também confere direito ao benefício, desde que comprovada por perícia médica, que impossibilite o segurado de exercer sua ocupação habitual e inviabilize sua readaptação. Esse entendimento reflete o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
Do caso concreto
No caso vertente, o apelante, exerce atividade rural, com 56 anos à época da perícia judicial, alega ser acometida de hipertensão arterial primária e doença isquêmica crônica do coração, sem perspectiva de irreversibilidade do quadro de saúde incapacitante. Assim, pretende a concessão de aposentadoria por invalidez ou, subsidiariamente, o restabelecimento do auxílio-doença.
O requisito da qualidade de segurado da apelante verifica-se preenchido, sendo ponto incontroverso nos autos.
A fim de se analisar o real quadro de saúde da parte, o Juízo a quo designou perícia médica, ocasião em que o perito apresentou as seguintes conclusões (ID 322723666):
DISCUSSÃO CONCLUSÂO
Conforme avaliação clínica mais exame físico detalhado, associado a embasamento teórico referenciado, seguido de critérios legais, fundamentados, e zelando pela justa obtenção da verdade, com imparcialidade.
Discussão:
Periciado Sr. Antonio Rozendo Rodrigues, idade 56 anos, relatou atividade agricultura familiar em propriedade assentamento Nova Esperança, apresentou nos autos ser portador de doenças crônicas cardiológicas.
Autor deu entrada em sala de perícia deambulando, sentou e levantou da cadeira sem dificuldade, equilíbrio preservado, eupneico, normocardio, BEG, normovigil, normotenaz, orientado auto e alo psiquicamente, humor eutímico, afeto normomodulavel.
Autor relatou uso de metroprolol, losartana, espironolactona, furosemida; relatou estar em avaliação cirúrgica por achados no exame de imagem em investigação; negou internação hospitalar recente; negou atendimento de urgência e emergência; relatou ter bronquite e fazer uso aerolin.
Parecer:
Mediante avaliação do autor Sr(a). Antonio Rozendo Rodrigues, portador de doenças crônicas arritmia cardíaca, estando clinicamente estável em tratamento conservador medicamentoso, negou outras terapias, negou agenda de cirurgia. EF: mãos calejadas, ausência de agravos clínicos e ortopédicos, autor apresenta redução da capacidade por limitações a realização de a atividades físicas com grandes esforços, quadro que gera redução da capacidade laboral; em atual perícia foi constatada incapacidade parcial permanente para atividades de trabalhos habituais que exija grandes esforço, sugiro mudança de função.
Nada havendo mais a relatar, damos por encerrado, encontrando-nos à disposição para qualquer esclarecimento.
Em resposta aos quesitos, o perito também informa que:
f) Doença/moléstia ou lesão torna o(a) periciado(a) incapacitado(a) para o exercício do último trabalho ou atividade habitual? Justifique a resposta, descrevendo os elementos nos quais se baseou a conclusão.
R: Sim, em atual avaliação achados limitantes incapacitantes para atividade habitual.
(...)
d) A incapacidade é parcial ou total?
R: Em atual perícia foi constatada incapacidade parcial permanente para atividades de trabalhos habituais que exija grandes esforço, sugiro mudança de função
Verifica-se, dessa forma, que o perito judicial analisou as enfermidades alegadas por meio de exames clínicos realizados diretamente, bem como pela avaliação da documentação médica, sendo conclusivo quanto à incapacidade laborativa parcial e permanente, em que, em tese, seria possível sua reabilitação em atividades que não se faça necessário esforço físico.
Oportuno mencionar que o juiz não está vinculado ao laudo pericial, conforme o artigo 479 do CPC, devendo considerar o conjunto de provas para formar sua convicção.
Ao examinar o conjunto probatório, considerando o inteiro teor da perícia judicial, a natureza das enfermidades que afetam a apelante, sua idade (56 anos), a baixa qualificação profissional e sua ocupação habitual (atividade de agricultura familiar), evidencia-se que há clara incapacidade laborativa e falta de oportunidade de reabilitação para o exercício de outras atividades. Portanto, é possível afirmar que a parte autora não possui condições de retornar ao mercado de trabalho. Assim, é cabível reconhecer seu direito ao benefício de aposentadoria por incapacidade total permanente.
Cumpre destacar que, conforme declarado pelo perito médico, a atividade atualmente exercida pela parte autora exige elevado esforço físico, o que se revela incompatível com o quadro clínico apresentado, notadamente diante das patologias cardíacas que a acometem, tais como arritmia e insuficiência cardíaca.
Diante desse contexto, considerando-se o conjunto probatório constante nos autos, especialmente a gravidade das enfermidades diagnosticadas, aliadas à idade avançada da parte autora, revela-se irrazoável presumir que esta possua plenas condições de reinserção no mercado de trabalho ou de reabilitação para o exercício de outra atividade laboral compatível com suas limitações.
Oportuno destacar o entendimento pacífico desta Décima Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. CONCESSÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. São requisitos dos benefícios postulados a incapacidade laboral, a qualidade de segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei nº 8.213/91.
2. No tocante à incapacidade, o sr. perito judicial concluiu se tratar de inaptidão laborativa de forma parcial e permanente desde 2002, em decorrência de cegueira do olho esquerdo e atrofia do nervo óptico esquerdo, afirmando que “as condições clínicas do paciente não se modificaram deste período (cessação do benefício) até a realização do exame oftalmológico pericial” (ID 302503487).
3. Em consulta ao extrato de dossiê previdenciário (ID 302503503 - Pág. 2), verifica-se que a parte autora satisfaz os requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado (carência e qualidade de segurado), uma vez que usufruiu de auxílio por incapacidade temporária por vinte anos (21/01/2009 a 11/02/2022).
4. Em que pese a conclusão do sr. perito judicial, cabe frisar que o julgador não está adstrito apenas à prova técnica para formar a sua convicção, podendo utilizar outros elementos constantes dos autos, especialmente quando coerentes entre si.
5. Sendo assim, diante do conjunto probatório e considerando o parecer elaborado pela perícia judicial, a parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente desde a data da cessação administrativa (11/02/2022).
6. Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5095572-09.2024.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 09/10/2024, DJEN DATA: 11/10/2024).
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PERMANENTE.
1. O benefício de auxílio doença é devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize temporariamente o exercício de sua profissão, nos termos do Art. 59, da Lei nº 8.213/91. Já a aposentadoria por invalidez, nos termos do Art. 42, da Lei nº 8.213/91, exige que o segurado seja considerado incapaz e insusceptível de convalescença para o exercício de ofício que lhe garanta a subsistência.
2. A jurisprudência flexibilizou o rigorismo legal, fixando entendimento no sentido de que não há falar em perda da qualidade de segurado se a ausência de recolhimento das contribuições decorreu da impossibilidade de trabalho de pessoa acometida de doença. Precedentes do e. STJ.
3. Laudo pericial conclusivo incapacidade total e permanente.
4. Considerando a soma e a natureza das patologias que acometem o autor, sua idade, e sua atividade habitual, é de se reconhecer o seu direito à percepção do benefício de auxílio doença e à sua conversão em aposentadoria por invalidez, pois indiscutível a falta de capacitação e de oportunidades de reabilitação para a assunção de outras atividades, sendo possível afirmar que se encontra sem condições de reingressar no mercado de trabalho.
5. Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora.
6. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
7. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
8. Apelação provida em parte.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5011706-81.2019.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 14/08/2024, DJEN DATA: 23/08/2024)
Nesse contexto, com base no conjunto de provas e no parecer da perícia judicial, a parte autora tem direito à concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, desde o requerimento administrativo do benefício por incapacidade temporária, qual seja, 10/08/2022, observando-se eventual prescrição quinquenal.
Os valores pagos na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de benefícios inacumuláveis no período, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Finalmente, quanto ao eventual prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Custas e despesas processuais
A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista 11.608/2003.
A isenção, porém, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovadas nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei 9.289/1996.
Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses 1.135/1991 e 1.936/1998 foi revogada pela Lei Estadual 3.779/2009 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual o INSS tem o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado.
Contudo, a parte vencida deverá arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Consectários legais
A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que se reporta à aplicação da EC 113/2021.
Quanto aos juros, destaque-se que são devidos até a data da expedição do ofício precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV), conforme o Tema 96/STF, firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 579.431, observando-se, a partir de então, o teor da Súmula Vinculante 17/STF.
Dos honorários advocatícios
Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC.
A verba honorária, conforme a Súmula 111 do STJ e o Tema 1105/STJ, incide sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão da requerente apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação incidirá sobre as parcelas vencidas até a data do presente acórdão.
Da tutela antecipada
Mantenho a tutela antecipada concedida por ocasião da r. sentença, adequando-a a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, em substituição ao auxílio por incapacidade temporária inicialmente determinado.
Na hipótese da necessidade de outras medidas executivas, estas devem ser requeridas perante o r. Juízo de origem, competente para tanto, ainda que o processo esteja nesta instância.
Dispositivo
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para conceder a aposentadoria por incapacidade permanente, fixando os consectários e honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. NULIDADE DE SENTENÇA. PRELIMINAR REJEITADA. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANEMTE. CONCESSÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não procede o pedido de nulidade da sentença em razão de laudo judicial não ter sido realizado por médico especializado. Com efeito, é sabido que a prova tem como destinatário o magistrado, a quem cabe avaliar quanto à sua suficiência, necessidade e relevância, não constituindo cerceamento de defesa o indeferimento de prova considerada inútil ou protelatória. A respeito, prescreve o artigo 370 do Código de Processo Civil que ao juiz é dado decidir acerca das provas que julga necessárias ao deslinde de mérito do processo.
2. A concessão da aposentadoria por incapacidade total e permanente (aposentadoria por invalidez), prevista no artigo 43, § 1º, da Lei 8.213/1991, exige a comprovação de incapacidade total e definitiva para o trabalho, por meio de exame médico-pericial realizado pela Previdência Social. No entanto, é pacífico o entendimento de que, para a concessão do referido benefício, também devem ser considerados a gravidade e a natureza das doenças que afetam o autor, sua idade, bem como sua ocupação habitual, que podem inviabilizar sua reabilitação.
3. Considerando o inteiro teor da perícia judicial, a natureza das enfermidades que afetam a apelante, sua idade, a baixa qualificação profissional e sua ocupação habitual, evidencia-se que há clara incapacidade laborativa e falta de oportunidade de reabilitação para o exercício de outras atividades
4. O juiz não está vinculado ao laudo pericial, conforme o artigo 479 do CPC, devendo considerar o conjunto de provas para formar sua convicção.
5. Diante do conjunto probatório, a parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente desde a data do requerimento administrativo.
6.Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal