
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005424-51.2024.4.03.6183
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: EZIO FACHINI
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
APELADO: AGENCIA INSS ARARAQUARA, GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM ARARAQUARA /SP, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005424-51.2024.4.03.6183
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: EZIO FACHINI
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
APELADO: AGENCIA INSS ARARAQUARA, GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM ARARAQUARA /SP, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Desembargadora Federal GABRIELA ARAUJO (Relatora): Trata-se de agravo interno interposto pela parte impetrante (ID 321253391), nos termos do artigo 1.021, do Código de Processo Civil, em face de decisão (ID 310637275) que deu parcial provimento ao recurso de apelação, para determinar o cômputo como tempo especial do período de 25/07/2002 a 29/05/2006.
Sustenta a parte impetrante, em síntese, que o artigo 10 da Lei Complementar nº 142/2013 veda a acumulação de reduções e, por tal motivo, se aplica o fator 1,32 no caso de trabalho especial desenvolvido por pessoa (homem) com deficiência leve, na forma do § 1º, do artigo 70-F, do Decreto nº 3.048/99, inserida pelo Decreto nº 8.145/2013, que estabelece os fatores de conversão para cada caso, de forma que é permitido o reconhecimento do exercício de atividades especiais, desenvolvidas por pessoas com deficiência e convertê-la para comum mediante o acréscimo legal.
Alega, também, que os períodos de 29/05/2006 a 24/05/2010, de 12/06/2010 a 13/09/2010, de 30/07/2011 a 30/10/2011 e de 10/12/2011 a 16/08/2013, devem ser reconhecidos como especiais, em razão do agente físico ruído, conforme o Perfil Profissiográfico – PPP acostado aos autos.
Aduz, ainda, que os períodos de 29/05/2006 a 19/12/2006, de 10/11/2007 a 01/03/2008, de 28/10/2008 a 01/01/2009, de 16/09/2009 a 23/05/2010, de 25/12/2009 a 26/01/2010, de 12/06/2010 a 13/09/2010 e de 30/07/2011 a 30/10/2011, também devem ser reconhecidos como especiais, nos termos do Tema 998 do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que esteve em gozo de auxílio por incapacidade temporária.
Requer o provimento do recurso, com a reforma da decisão recorrida, para reconhecer como especiais os períodos acima descritos, bem como a possibilidade de conversão em tempo comum, com a aplicação do fator de conversão (1,32), dos períodos especiais exercidos anteriormente e posteriormente ao início da deficiência (30/05/2006).
Intimado, nos termos do §2º., do artigo 1.021, do CPC, o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, não apresentou contrarrazões.
Ciência do Ministério Público Federal, sem nada a requerer (ID 322204147).
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005424-51.2024.4.03.6183
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: EZIO FACHINI
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
APELADO: AGENCIA INSS ARARAQUARA, GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM ARARAQUARA /SP, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
V O T O
A Excelentíssima Desembargadora Federal GABRIELA ARAUJO (Relatora): Conheço do agravo interno interposto pela parte impetrante, nos termos do artigo 1.021, do Código de Processo Civil.
A análise dos autos revela que a parte impetrante objetiva a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência, nos termos da Lei Complementar nº 142/2013, com o reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 25/07/2002 a 08/02/2004, 15/03/2004 a 24/05/2010, 12/06/2010 a 13/09/2010, 30/07/2011 a 30/10/2011 e de 10/12/2011 a 16/08/2013, trabalhados na empresa Bridgestone/Firestone do Brasil Indústria e Comércio Ltda., e quanto aos períodos de 25/07/2002 a 19/12/2006, de 10/11/2007 a 01/03/2008, 28/10/2008 a 01/01/2009, 16/09/2009 a 23/05/2010, 25/12/2009 a 26/01/2010, 12/06/2010 a 13/09/2010 e de 30/07/2011 a 30/10/2011, nos quais auferiu o benefício de auxílio por incapacidade temporária.
Outrossim, os documentos (ID 307421038 e ID 307421043) comprovam que a parte impetrante, em 05/05/2023, requereu administrativamente a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência, indeferido pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em razão de não ter sido comprovado o tempo de contribuição necessário para a sua concessão, na forma do artigo 3º da Lei Complementar nº 142/2013, tendo a perícia médica e avaliação social concluído pela deficiência em grau leve (termo inicial a partir de 30/05/2006) e, quanto ao exercício de atividade especial, houve enquadramento apenas parcial, em razão da não comprovação de exposição a agentes prejudiciais à saúde.
A aposentadoria da pessoa com deficiência ao segurado do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) foi disciplinada pela Lei Complementar nº 142, de 08/05/2013, em obediência ao § 1º do artigo 201 da Constituição da República.
A lei de regência foi disciplinada pelos artigos 70-A a 70-J do Decreto nº 3.048/1999, com redação do Decreto nº 8.145, de 03/12/2013 e modificações posteriores.
A regulamentação prevê a necessidade de comprovação do grau de deficiência na data da entrada do requerimento (DER) ou do implemento dos requisitos, por meio de avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, na forma do artigo 70-A, com redação do Decreto nº 10.410/2020.
O tempo de contribuição foi fixado pelo artigo 3º da Lei Complementar nº 142, de 08/05/2013, in verbis:
"Art. 3º É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou
IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período. (...)"
Com relação à cumulação dos redutores de tempo de serviço decorrentes do exercício de atividade exercida sob condição especial que prejudique a saúde ou a integridade física, cumulada com a estabelecida pela Lei Complementar nº 142/2013, assim dispõe seu artigo 10:
"Art. 10. A redução do tempo de contribuição prevista nesta Lei Complementar não poderá ser acumulada, no tocante ao mesmo período contributivo, com a redução assegurada aos casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física".
Assim, a vedação trazida pela Lei Complementar nº 142/2013, em seu artigo 10, diz respeito à utilização para o mesmo período contributivo do redutor aplicado ao tempo de serviço especial com aquele utilizado para diminuir o tempo contributivo da pessoa com deficiência.
Em síntese, portanto, a proibição prevista no dispositivo legal mencionado se restringe à conversão de tempo especial em comum, pelos fatores apontados no artigo 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, para posterior utilização nos benefícios previdenciários com tempo de contribuição reduzido, elencados na Lei Complementar citada.
Logo, para o cômputo do tempo de contribuição, admite-se a conversão do tempo contribuição especial em tempo comum para a concessão da aposentadoria da pessoa com deficiência, devendo-se observar os fatores de conversão previstos no artigo 70-E do Decreto 3.048/1999:
"Art. 70-E. Para o segurado que, após a filiação ao RGPS, tornar-se pessoa com deficiência, ou tiver seu grau alterado, os parâmetros mencionados nos incisos I, II e III do caput do art. 70-B serão proporcionalmente ajustados e os respectivos períodos serão somados após conversão, conforme as tabelas abaixo, considerando o grau de deficiência preponderante, observado o disposto no art. 70-A: (Incluído pelo Decreto nº 8.145, de 2013)"
Contudo, como é vedada a acumulação da redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência com aquela assegurada aos casos de atividades exercidas em condições especiais (artigo 70-F, caput), cabe ao segurado optar pela redução que lhe for mais favorável (artigo 70-F, parágrafo 1º).
"Art. 70-F. A redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência não poderá ser acumulada, no mesmo período contributivo, com a redução aplicada aos períodos de contribuição relativos a atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Incluído pelo Decreto nº 8.145, de 2013)
§ 1º É garantida a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado, inclusive da pessoa com deficiência, para fins da aposentadoria de que trata o art. 70-B, se resultar mais favorável ao segurado, conforme tabela abaixo: (Incluído pelo Decreto nº 8.145, de 2013)"
Dessa forma, não há óbice para a conversão do tempo especial pela exposição a agentes nocivos, desenvolvido antes e depois do surgimento da deficiência, pelos fatores proporcionalmente ajustados, previstos no Decreto nº 3.048/99, para fins de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.
Por tal motivo, assiste razão à parte impetrante no tocante ao equívoco atinente à limitação do reconhecimento e conversão do período laborado em condições insalubres, posteriormente à constatação da deficiência, pelos fatos proporcionalmente ajustados e previstos no artigo 70-F, do Decreto nº 3.048/1999, incluído pelo Decreto nº 8.145/2013.
Nesse sentido, reporto-me ao julgado desta E. Corte:
"PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. RECURSO PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação da parte autora em face da sentença que julgou improcede procedente o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão: (i) saber acerca da possibilidade de reconhecimento da natureza especial das atividades desempenhadas em razão da exposição de agentes nocivos; e (ii) saber se houve preenchimento dos requisitos para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A CRFB/88, em seu §1º, art. 201, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 47, de 2005, autorizou a instituição de critério diferenciado de aposentadoria às pessoas com deficiência, filiadas ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS. Após oito anos, a Lei Complementar nº 142, de 08 de maio de 2013, estabeleceu os requisitos e critérios especiais para a concessão de aposentadoria à pessoa com deficiência. Conceituou-se, para efeitos previdenciários, a pessoa com deficiência como "aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." (art. 2º). Ficou estabelecido pelo texto normativo (art. 3º) ser devida aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado com deficiência que comprove os seguintes requisitos: a) 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte), se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; b) 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro), se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; c) 33 (vinte e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito), se mulher, no caso de segurado com deficiência leve.
4. No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
5. Nos períodos de 21.03.1994 a 17.01.1997, 08.09.1999 a 13.09.2006, 20.09.2006 a 05.07.2007 e 01.08.2008 a 08.04.2014, a parte autora, nas funções de auxiliar de enfermagem e enfermeira, esteve exposta a agentes biológicos, em virtude de contato permanente com pacientes ou materiais infectocontagiantes, conforme formulários e PPPs anexados aos autos, devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses intervalos, conforme código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
6. A Lei Complementar nº 142/2013, em seu art. 10, vedou a cumulação, no que diz respeito ao mesmo período contributivo, do redutor aplicado ao tempo de serviço especial com aquele utilizado para diminuir o tempo contributivo da pessoa com deficiência. Nesse sentido, a proibição trazida pelo dispositivo legal se restringe à conversão de tempo especial em comum, pelos fatores apontados no art. 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, para posterior utilização nos benefícios previdenciários com tempo de contribuição reduzido, elencados na Lei Complementar citada. Por outro lado, não existe óbice para conversão de tempo especial, desenvolvido antes e depois do surgimento da deficiência, pelos fatores proporcionalmente ajustados, previstos no Decreto nº 3.048/99. Nessa direção especifica o seu art. 70-F, §1º, incluído pelo Decreto nº 8.145/2013.
7. Demonstrando a parte autora qualidade de segurado, tempo de contribuição correspondente a 30 (trinta) anos, 06 (seis) meses e 17 (dezessete) dias, e a condição de pessoa com deficiência de grau leve, faz jus ao benefício previdenciário pleiteado, desde a data do requerimento administrativo (DER 20.08.2023).
8. Aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência concedida na forma prevista nos arts. 8º e seguintes da LC 142/2013.
IV. DISPOSITIVO
9. Apelação provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, §§ 1º e 7º; Lei Complementar 142/2013; Decreto nº 53.831/1964, Decreto nº 83.080/1979, Decretos nº 2.172/1997 e Decreto nº 3.049/1999.
Jurisprudência relevante citada: STJ; Resp 436661/SC; Quinta Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482); STJ, REsp 1401619/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014; STJ, REsp 1859330/CE, 2ª Turma, Ministro Herman Benjamin, julgado em 10.03.2020, DJe 31.08.2020." (ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL nº ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, Relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, Julgamento: 14/05/2025, DJEN Data: 14/05/2025).
Assim considerando, passo a reanálise do caso concreto.
Quanto aos períodos em que a parte impetrante alega ter auferido o benefício de auxílio por incapacidade temporária (acidente do trabalho): 25/07/2002 a 19/12/2006; 10/11/2007 a 01/03/2008; 28/10/2008 a 01/01/2009; 16/09/2009 a 23/05/2010; 25/12/2009 a 26/01/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e 30/07/2011 a 30/10/2011, de fato, a consulta ao sistema PREVJUD – extrato previdenciário – CNIS, comprova que em tais períodos a parte impetrante auferiu benefício por incapacidade.
Com efeito, o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais n. 1759098/RS e 1723181/RS – Tema 998, fixou a seguinte tese, conforme ementa que segue:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 1.036 DO CÓDIGO FUX. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Até a edição do Decreto 3.048/1999 inexistia na legislação qualquer restrição ao cômputo do tempo de benefício por incapacidade não acidentário para fins de conversão de tempo especial. Assim, comprovada a exposição do Segurado a condições especiais que prejudicassem a sua saúde e a integridade física, na forma exigida pela legislação, reconhecer-se-ia a especialidade pelo período de afastamento em que o Segurado permanecesse em gozo de auxílio-doença, seja este acidentário ou previdenciário.
2. A partir da alteração então promovida pelo Decreto 4.882/2003, nas hipóteses em que o Segurado fosse afastado de suas atividades habituais especiais por motivos de auxílio-doença não acidentário, o período de afastamento seria computado como tempo de atividade comum.
3. A justificativa para tal distinção era o fato de que, nos períodos de afastamento em razão de benefício não acidentário, não estaria o Segurado exposto a qualquer agente nocivo, o que impossibilitaria a contagem de tal período como tempo de serviço especial.
4. Contudo, a legislação continuou a permitir o cômputo, como atividade especial, de períodos em que o Segurado estivesse em gozo de salário-maternidade e férias, por exemplo, afastamentos esses que também suspendem o seu contrato de trabalho, tal como ocorre com o auxílio-doença não acidentário, e retiram o Trabalhador da exposição aos agentes nocivos. Isso denota irracionalidade na limitação imposta pelo decreto regulamentar, afrontando as premissas da interpretação das regras de Direito Previdenciário, que prima pela expansão da proteção preventiva ao Segurado e pela máxima eficácia de suas salvaguardas jurídicas e judiciais.
5. Não se pode esperar do poder judicial qualquer interpretação jurídica que venha a restringir ou prejudicar o plexo de garantias das pessoas, com destaque para aquelas que reinvindicam legítima proteção do Direito Previdenciário. Pelo contrário, o esperável da atividade judicante é que restaure visão humanística do Direito, que foi destruída pelo positivismo jurídico.
6. Deve-se levar em conta que a Lei de Benefícios não traz qualquer distinção quanto aos benefícios auxílio-doença acidentário ou previdenciário. Por outro lado, a Lei 9.032/1995 ampliou a aproximação da natureza jurídica dos dois institutos e o § 6o. do artigo 57 da Lei 8.213/1991 determinou expressamente que o direito ao benefício previdenciário da aposentadoria especial será financiado com os recursos provenientes da contribuição deque trata o art. 22, II da Lei 8.212/1991, cujas alíquotas são acrescidas conforme a atividade exercida pelo Segurado a serviço da empresa, alíquotas, estas, que são recolhidas independentemente de estar ou não o Trabalhador em gozo de benefício.
7. Note-se que o custeio do tempo de contribuição especial se dá por intermédio de fonte que não é diretamente relacionada à natureza dada ao benefício por incapacidade concedido ao Segurado, mas sim quanto ao grau preponderante de risco existente no local de trabalho deste, o que importa concluir que, estando ou não afastado por benefício movido por acidente do trabalho, o Segurado exposto a condições nocivas à sua saúde promove a ocorrência do fato gerador da contribuição previdenciária destinada ao custeio do benefício de aposentadoria especial.
8. Tais ponderações, permitem concluir que o Decreto 4.882/2003 extrapolou o limite do poder regulamentar administrativo, restringindo ilegalmente a proteção exclusiva dada pela Previdência Social ao trabalhador sujeito a condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física.
9. Impõe-se reconhecer que o Segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese: O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial. grifei
10. Recurso especial do INSS a que se nega provimento.
Depreende-se, assim, a possibilidade do cômputo dos períodos em que a parte impetrante auferiu o benefício de auxílio por incapacidade temporária, como especiais.
Outrossim, no tocante aos períodos de 25/07/2002 a 08/02/2004; 15/03/2004 a 24/05/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e de 10/12/2011 a 16/08/2013, a parte impetrante alega ter laborado na empresa Bridgestone/Firestone do Brasil Indústria e Comércio Ltda., e pugna pelo reconhecimento como tempo especial, decorrente da exposição ao agente agressivo ruído, acima dos limites de tolerância permitidos.
Neste passo, cumpre registrar que até 28/04/1995, não é exigido o caráter habitual e permanente da exposição na aferição do agente nocivo, por ausência de previsão legal.
A partir de 29/04/1995, com a entrada em vigor a Lei n. 9.032, de 28/04/1995, que alterou o § 3º do artigo 57 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, passou a exigir que o trabalho sob o efeito do agente nocivo seja permanente, não ocasional nem intermitente, conforme o C. STJ assentou no Tema 534/STJ, acima referido.
Nesse sentido, enfatiza o C. STJ que: "a permanência e a habitualidade da exposição a agentes nocivos à saúde são requisitos exigíveis apenas para as atividades exercidas a partir de 29/04/1995, quando entrou em vigor a Lei n. 9.032/1995, que alterou a redação do art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/1991", (AgInt REsp 1.695.360/SP, rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, j. 1º/04/2019, DJe 03/04/2019)
Tratando mais detidamente do agente agressivo ruído, importante consignar que a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
Com relação à metodologia científica a ser utilizada para medição, não há qualquer exigência específica na legislação, desde que o laudo seja elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, que poderá adotar a metodologia que entender mais adequada ao caso concreto, seguindo os quesitos do formulário fornecido pelo próprio Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. É o que se extrai do §1º, do artigo 58, da Lei nº 8.213/91:
“Art. 58 (...)
§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista”.
Nessa esteira, convém ressaltar trecho de precedente desta E. Corte, no sentido de que:
“Quanto ao argumento de que o PPP não observou a metodologia correta, verifica-se que legislação pertinente não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5256548-29.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 18/08/2020, Intimação via sistema DATA: 21/08/2020).
Além disso, observo que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça julgou o Tema Repetitivo 1.083, em 18/11/2021, versando sobre a possibilidade de reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, considerando-se apenas o nível máximo aferido (critério "pico de ruído"), a média aritmética simples ou o Nível de Exposição Normalizado (NEN), tendo fixado a seguinte tese:
“O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço."
Assim considerando, a análise do PPP (ID 307421041) revela que nos períodos acima especificados, quais sejam: 25/07/2002 a 08/02/2004; 15/03/2004 a 24/05/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e de 10/12/2011 a 16/08/2013 – com exceção do período de 10/12/2011 a 09/12/2012 (83,90 dB(A) dentro do limite permitido), a parte impetrante esteve exposta ao agente agressivo ruído, acima dos limites de tolerância permitidos.
Acresce relevar, que não obstante a parte impetrante, no período de 10/12/2011 a 09/12/2012, tenha ficado exposta ao agente ruído em limite inferior ao permitido, a análise do PPP revela que neste mesmo período, também esteve exposta ao agente químico ciclohexano-n-hexano-iso, na fabricação de pneus, condição de trabalho considerada especial, pelo Código 1.0.17 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 e pelo Anexo 13 da NR-15 do MTE.
Em decorrência, o conjunto probatório dos autos revela o exercício de atividade especial, nos períodos de: 25/07/2002 a 19/12/2006; 10/11/2007 a 01/03/2008; 28/10/2008 a 01/01/2009; 16/09/2009 a 23/05/2010; 25/12/2009 a 26/01/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e 30/07/2011 a 30/10/2011, nos quais a parte impetrante auferiu o benefício de auxílio por incapacidade temporária (acidente do trabalho), conforme o Tema 998 do C. STJ.
E, também, quanto aos períodos laborados perante a empresa Bridgestone/Firestone do Brasil Indústria e Comércio Ltda.,: 25/07/2002 a 08/02/2004; 15/03/2004 a 24/05/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e de 10/12/2011 a 16/08/2013, em razão da exposição aos agentes agressivos ruído e químico (hidrocarboneto).
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO, interposto pela parte impetrante, para reconhecer como tempo especial, os períodos acima especificados, podendo ser convertidos em comum, observando os fatores de conversão, na forma do artigo 70-F, § 1º, do Decreto 3.048/1999, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência, nos termos da fundamentação supra.
Sem condenação em honorários, na forma do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LC 142/2013. ATIVIDADE ESPECIAL. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. TEMA 998 C. STJ E RUÍDO. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO EM TEMPO COMUM. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO FATOR DE CONVERSÃO. ARTIGO 70-E DO DECRETO 3.048/1999. AGRAVO INTERNO PROVIDO EM PARTE.
1. A aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) foi disciplinada pela Lei Complementar nº 142, de 08/05/2013, em obediência ao § 1º do artigo 201 da Constituição da República, e é devida aos segurados.
2. A lei de regência foi disciplinada pelos artigos 70-A a 70-J do Decreto nº 3.048/1999, com redação do Decreto nº 8.145, de 03/12/2013 e modificações posteriores.
3. A regulamentação prevê a necessidade de comprovação do grau de deficiência na data da entrada do requerimento (DER) ou do implemento dos requisitos, por meio de avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, na forma do artigo 70-A, com redação do Decreto nº 10.410/2020.
4. A vedação prevista no artigo 10, da LC nº 142/2013 se restringe à conversão de tempo especial em comum, pelos fatores apontados no artigo 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, para posterior utilização nos benefícios previdenciários com tempo de contribuição reduzido, elencados na Lei Complementar citada. Logo, para o cômputo do tempo de contribuição, admite-se a conversão do tempo contribuição comum em tempo para a concessão da aposentadoria da pessoa com deficiência, devendo-se observar os fatores de conversão previstos no artigo 70-E do Decreto 3.048/1999.
5. Em razão da vedação a acumulação da redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência com aquela assegurada aos casos de atividades exercidas em condições especiais (artigo 70-F, caput), cabe ao segurado optar pela redução que lhe for mais favorável (artigo 70-F, parágrafo 1º).
6. Não há óbice para a conversão do tempo especial pela exposição a agentes nocivos, desenvolvido antes e depois do surgimento da deficiência, pelos fatores proporcionalmente ajustados, previstos no Decreto nº 3.048/99, para fins de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.
7. Quanto aos períodos em que a parte impetrante alega ter auferido o benefício de auxílio por incapacidade temporária (acidente do trabalho): 25/07/2002 a 19/12/2006; 10/11/2007 a 01/03/2008; 28/10/2008 a 01/01/2009; 16/09/2009 a 23/05/2010; 25/12/2009 a 26/01/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e 30/07/2011 a 30/10/2011, de fato, a consulta ao sistema PREVJUD – extrato previdenciário – CNIS, comprova que em tais períodos a parte impetrante auferiu benefício por incapacidade.
8. O C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais n. 1759098/RS e 1723181/RS – Tema 998, fixou a seguinte tese: “O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.” Depreende-se, assim, a possibilidade do cômputo dos períodos em que a parte impetrante auferiu o benefício de auxílio por incapacidade temporária, como especial.
9. No tocante aos períodos de 25/07/2002 a 08/02/2004; 15/03/2004 a 24/05/2010; 12/06/2010 a 13/09/2010 e de 10/12/2011 a 16/08/2013, em que a parte impetrante alega ter laborado na empresa Bridgestone/Firestone do Brasil Indústria e Comércio Ltda., exposta ao agente agressivo ruído acima dos limites de tolerância permitidos, a análise ao PPP (ID 307421041) revela que com exceção do período de 10/12/2011 a 09/12/2012 (83,90 dB(A) dentro do limite permitido), a parte impetrante esteve exposta ao agente agressivo ruído, acima dos limites de tolerância permitidos.
10. Não obstante a parte impetrante, no período de 10/12/2011 a 09/12/2012, tenha ficado exposta ao agente ruído em limite inferior ao permitido, a análise do PPP revela que neste mesmo período, também esteve exposta ao agente químico ciclohexano-n-hexano-iso, na fabricação de pneus, condição de trabalho considerada especial, pelo Código 1.0.17 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 e pelo Anexo 13 da NR-15 do MTE.
11. Agravo interno provido em parte.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal