A EXMA. DESEMBARGADORA FEDERAL ANA IUCKER
Trata-se de agravo interno interposto pelo INSS em face de decisão monocrática que deu provimento à apelação da parte autora para reconhecer os períodos especiais na atividade de corte e cultivo de cana-de-açúcar e conceder aposentadoria especial.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Ao instituir a possibilidade do julgamento monocrático, o Código de Processo Civil intensifica a necessidade de observância dos princípios constitucionais da celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.
De acordo com a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, ao proferir decisão monocrática, o relator não viola o princípio da colegialidade, ante a previsão do agravo interno para submissão do julgado ao Órgão Colegiado. Nesse sentido: AgInt no REsp n. 1.831.566/PR, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 12/9/2022, DJe de 14/9/2022.
Quanto ao mérito, em que pese a argumentação da agravante, verifica-se que não trouxe tese jurídica capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado na decisão monocrática recorrida, sendo incabível a retratação.
De fato, quanto à matéria arguida pelo agravante, não se desconhece o entendimento sedimentado no PUIL 452/PE, no qual a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou convicção de que o trabalho no setor sucroalcooleiro, por si só, não enseja o reconhecimento da especialidade por função, já que, embora desgastante, a atividade ocorre exclusivamente no campo agrícola, e não no pecuário.
Todavia, revendo posicionamento anterior e aderindo ao entendimento consolidado desta Colenda Nona Turma, reconhece-se que a atividade de corte de cana-de-açúcar caracteriza-se por condições de labor extremamente penosas, com exposição habitual e permanente a agentes nocivos à saúde do trabalhador.
Trata-se, sabidamente, de uma das atividades mais extenuantes no setor agroindustrial. Os trabalhadores são submetidos a jornadas exaustivas, sob condições climáticas adversas, realizando esforço físico intenso e repetitivo, fatores que resultam em elevado desgaste físico e mental. O impacto da atividade sobre o organismo é amplamente reconhecido por estudos médico-laborais, que indicam risco aumentado de doenças musculoesqueléticas, cardiovasculares e térmico-regulatórias, configurando penosidade incompatível com a permanência prolongada no labor sem comprometimento à saúde.
O corte de cana-de-açúcar também expõe o trabalhador a agentes químicos perigosos, como os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs), oriundos da queima da palha da cana e da manipulação de maquinário e insumos agrícolas. Segundo estudos científicos, a inalação desses compostos está associada a doenças respiratórias crônicas, dermatoses ocupacionais e a um risco aumentado de doenças neoplásicas.
Dessa forma, até 28/04/1995, é cabível o enquadramento profissional da atividade de corte e plantio de cana-de-açúcar com base no código 2.2.1 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964, assegurando ao trabalhador o direito à aposentadoria especial, em consonância com a proteção conferida pela legislação previdenciária e pela jurisprudência iterativa desta Corte.
A argumentação da autarquia federal de que a legislação exige a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos não afasta o reconhecimento da especialidade no caso concreto. Conforme demonstrado no laudo pericial e na decisão monocrática, restou comprovada a exposição habitual e permanente a agentes nocivos, especialmente calor, radiações não ionizantes e hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) decorrentes da queima da palha de cana.
O enquadramento realizado na decisão monocrática não se baseou em mera presunção, mas sim em laudo pericial que atestou concretamente as condições insalubres do trabalho exercido pelo segurado no cultivo de cana-de-açúcar, incluindo exposição ao calor e radiações não ionizantes de forma habitual e permanente.
Quanto ao PUIL 452/PE do STJ, a decisão monocrática reconheceu expressamente a existência desse precedente, mas optou por seguir o entendimento consolidado desta Nona Turma, que considera a especialidade da atividade de corte de cana-de-açúcar em razão das condições extremamente penosas e da exposição a agentes nocivos comprovados pericialmente.
Assim, desnecessário o acréscimo de fundamentação para além dos argumentos já consignados na decisão agravada, os quais adoto como razão de decidir, ficando mantida a decisão agravada.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO ao agravo interno do INSS.