Insurge-se a Autarquia Previdenciária em face de decisão monocrática do Relator, proferida com fundamento no art. 932 do Código de Processo Civil.
Posta essa baliza, tenho que o agravo interposto merece parcial acolhimento.
Reproduzo abaixo, por oporto, excertos da decisão recorrida:
"(...)
DO EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL (EPI)
De início, impõe destacar-se que o exame da utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) passou a ser exigido para fins de aferição da intensidade do agente agressivo e, consequentemente, caracterização do tempo especial, a partir da edição da MP n. 1.729, de 02.12.1998, convertida na Lei n. 9.732, de 11.12.1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da LBPS. Assim, apenas para o período laboral posterior a 03.12.1998 é que a informação relativa ao EPI eficaz passou a fundamentar o afastamento da especialidade do labor em favor do INSS.
No entanto, a discussão sobre o uso de EPI eficaz encontra-se balizada pelo C. STF no julgamento do ARE n. 664.335, Rel. Ministro LUIZ FUX, sob os auspícios da repercussão geral, tendo sido cristalizadas duas teses do Tema 555/STF: (i)"a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; (ii) "a segunda tese fixada (...): na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". (ARE 664335, Relator Ministro LUIZ FUX, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, publ. 12/02/2015, trâns. julg. 04/03/2015).
A 1ª Seção do C. STJ, por unanimidade, afetou o RESP nº 2.082.072/RS sob o rito dos recursos repetitivos, trazendo nova delimitação à controvérsia objeto do Tema nº 1090, em substituição ao recurso especial originariamente afetado.
Assim, em julgamento realizado em 09.04.2025, com publicação no DJen de 22.04.2025, foram aprovadas as seguintes teses no Tema 1090/STJ:
"I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor"
Excepcionam-se, nos termos do item I da tese firmada e do exame do voto do acórdão respectivo, de relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, as hipóteses nas quais é irrelevante a discussão sobre a eficácia do EPI - uma vez que as condições do labor permaneceriam nocivas à saúde do trabalhador mesmo com sua presença, não havendo eficácia suficiente à neutralização ou descaracterização do trabalho em condições especiais, tornando-se inócua a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI). São elas:
(a) Ruído, diante da tese firmada no julgamento do Tema nº 555 do C. STF;
(b) Enquadramento pela categoria profissional, devido à presunção absoluta de sua nocividade;
(c) Períodos laborais anteriores à edição da MP n. 1.729, de 02.12.1998, convertida na Lei n. 9.732, de 11.12.1998;
(d) Agentes nocivos comprovadamente cancerígenos do grupo I da LINACH, nos termos do art. 68, § 4º Decreto nº 3.048/99;
(e) Periculosidade (situações envolvendo a exposição do segurado ao agente nocivo eletricidade e vigilante, a exemplo), diante da inexistência de equipamentos capazes de descaracterizar o risco da atividade.
Por fim, ressalte-se que, nos termos do regulamento aplicável ao tema, somente será considerado eficaz o EPI que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade do agente e que esteja em conformidade com a NR-06 do MTE, além de observar os seguintes requisitos estabelecidos no art. 291 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022:
I - da hierarquia estabelecida na legislação trabalhista, ou seja, medidas de proteção coletiva, medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho e utilização de EPI, nesta ordem, admitindo-se a utilização de EPI somente em situações de inviabilidade técnica, insuficiência ou provisoriamente até a implementação do EPC ou, ainda, em caráter complementar ou emergencial;
II - das condições de funcionamento e do uso ininterrupto do EPI ao longo do tempo, conforme especificação técnica do fabricante, ajustada às condições de campo;
III - do prazo de validade, conforme Certificado de Aprovação do Ministério do Trabalho e Previdência ou do órgão que venha sucedê-la;
IV - da periodicidade de troca definida pelos programas ambientais, comprovada mediante recibo assinado pelo usuário em época própria; e
V - da higienização
(...)
DO CASO CONCRETO
Insurge-se o INSS em face da sentença que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial para, mediante o reconhecimento da atividade especial no período de 10.11.2010 a 28.02.2022, condenar a autarquia à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER em 19.05.2022 (ID 337401324 - fls.01).
Passo ao exame do período controverso, face às provas colacionadas aos autos:
- de 10.11.2010 a 28.02.2022
Empregador: NENA LOCAÇÃO E TRANSPORTES LTDA
Atividades: ajudante, abastecedor (oficina) e controlador de acesso (portaria)
Provas: cópia da CTPS (ID 337401326 - fls. 02) e PPP (ID 337401324 - fls. 12/13, com emissão em 09.05.2022 - anexo ao processo administrativo DER 19.05.2022; ID 337401325).
Agente nocivo: ruído de 85 dB(A), óleo e graxa
Conclusão: possível o enquadramento do período laboral em questão por exposição aos agentes nocivos ruído e químicos, nos termos dos códigos 1.1.5 do anexo ao Decreto nº 83.080/79 e 1.0.19 do Decreto 3.048/99, respectivamente.
Observo, nesse ponto, que para a finalidade de conversão em comum, pelo fator 1,4, possível somente a consideração do período de 10.11.2010 até 12.11.2019, nos termos do art. 25, §2º da EC nº103/2019.
A utilização de metodologia diversa não descaracteriza a especialidade, uma vez que demonstrada a exposição ao agente nocivo, por meio do PPP apresentado, documento que reúne as informações laborais do trabalhador, sua exposição a agentes nocivos conforme indicação do laudo ambiental da empresa empregadora, com o nome do profissional legalmente habilitado, responsável pela elaboração dessa perícia e a assinatura da empresa ou do preposto respectivo.
Nesse sentido já decidiu este Tribunal: Ap - Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia - 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 07.12.2018; Ap - Apelação Cível - 3652270007103-66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira - 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 19.07.2017.
Atente-se à regularidade formal dos documentos apresentados, inexistindo necessidade de contemporaneidade do formulário ou laudo ao período de exercício da atividade insalubre, à falta de previsão legal nesse sentido e de comprovação de significativa alteração no ambiente laboral.
Quanto aos agentes comprovadamente cancerígenos, constantes no Grupo 1 da LINACH, necessário atentar-se à tese firmada no julgamento do Tema 170/TNU:
"A redação do art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99 dada pelo Decreto 8.123/2013 pode ser aplicada na avaliação de tempo especial de períodos a ele anteriores, incluindo-se, para qualquer período: (1) desnecessidade de avaliação quantitativa; e (2) ausência de descaracterização pela existência de EPI".
Cumpre esclarecer, ainda, que os agentes químicos não exigem mensuração, em face do aspecto qualitativo da exposição, conforme previsto no Anexo nº 13 da NR-15, aprovada pela Portaria nº 3.214/1978 do Ministério do Trabalho.
Nessa linha: TRF 3ª Região, AC nº 2119587 / SP, 0043695-33.2015.4.03.9999, Décima Turma, Rel. Desembargador Federal Baptista Pereira, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09.08.2018.
Frise-se ainda que, para o período ora reconhecido como sendo de atividade especial, não há informação concreta e comprovada de que o EPI utilizado no labor era de fato eficaz à neutralização do agente nocivo. Havendo dúvida ou divergência sobre a sua real eficácia, a conclusão deve ser pela especialidade do labor, nos termos do Tema 1.090/STJ. (...)"
No caso concreto, revendo o conjunto probatório colacionado aos autos, observo que para a comprovação da especialidade do intervalo de 10.11.2010 a 28.02.2022, no qual o autor laborou junto à empresa Nena Locação e Transportes LTDA, o documento apresentado como prova da atividade nociva, no caso o PPP ID 337401324- fls. 12/13 (documento anexo ao processo administrativo), atesta a exposição do demandante a agentes químicos da espécie óleo e graxa, o que enseja o reconhecimento do labor nocivo, nos termos do código 1.0.19 do Decreto nº3.048/99 e código 1.2.11 do anexo ao Decreto nº 83.080/79.
Contudo, excluo da fundamentação da decisão recorrida, que o labor nocivo se faz com amparo também na exposição ao agente nocivo ruído no patamar de 85 dB.
Na hipótese, o aludido documento PPP informou a exposição ao ruído variável entre 72/85 dB, de maneira que à luz dos parâmetros do Tema 1083 do C. STJ, não constitui prova apta a amparar o enquadramento do labor especial, com fundamento na exposição ao ruído.
Destaque-se que o C. STJ, no tocante à metodologia adequada para aferição do agente ruído, ao julgar os recursos especiais representativos de controvérsia n.s. 1.886.795/RS e 1.890.010/RS, fixou a seguinte tese no bojo do Tema n. 1083:
"O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço."
Em resumo, decidiu o C. STJ não haver imposição normativa de técnica específica para medição da intensidade de ruído antes de 18.11.2003, quando foi editado o Decreto nº 4.882/2003. A partir de tal data, contudo, passou-se a exigir que o ruído fosse aferido pelo Nível de Exposição Normalizado (NEN). Todavia, no caso de inexistir no PPP ou no LTCAT, após 18.11.2003, a indicação do nível de ruído, pela técnica adequada, deverá ser produzida prova pericial, aplicando o perito do juízo critério diverso, qual seja, o pico de ruído.
Dessa forma, para o ruído aferido em intensidade variável, em data anterior a 19.11.2003, sem indicação da média ponderada (NR. 15 - Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.214/78, Anexo 1), deve prevalecer a maior pressão sonora presente no setor, por se sobrepor ao menor. Contudo, não é possível admitir o "pico de ruído" para período posterior 18.11.2003, como é o caso dos autos.
Nesse sentido, confiram-se os julgados: STJ, REsp 1904743, Ministro Gurgel de Faria, decisão monocrática publicada em 01/12/20; TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - 5093985-25.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal Sergio Nascimento, julgado em 23/09/2020, e - DJF3 Judicial 1 data: 24/09/2020; TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - 5002606-79.2018.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal Maria Lucia Lencastre Ursaia, julgado em 12/11/2020, e - DJF3 Judicial 1 data: 17/11/2020; TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - 5028821-50.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal Paulo Octavio Baptista Pereira, julgado em 03/12/2020, e - DJF3 Judicial 1 data: 09/12/2020; TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - 5003399-46.2018.4.03.6128, Rel. Desembargador Federal Nelson de Freitas Porfirio Junior, julgado em 20/08/2020, e - DJF3 Judicial 1 data: 25/08/2020; STJ (AgRg no REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe 13/03/2015).
Mantem-se, no entanto, os demais termos da decisão agravada que admitiu o labor especial para o intervalo de 10.11.2010 a 28.02.2022, pela exposição ao agente químico hidrocarboneto, uma vez que satisfatoriamente comprovada a nocividade desse interregno laboral em questão à luz do PPP apresentado.
Por oportuno, observa-se que sendo a decisão singular recorrível via agravo interno (art. 1.021, caput, do CPC), não fica prejudicado o princípio da colegialidade.
Nesse sentido, já decidiu o STJ que "eventual mácula na deliberação unipessoal fica superada, em razão da apreciação da matéria pelo órgão colegiado na seara do agravo interno" (AgInt no AREsp 999.384/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, DJe 30.08.2017; REsp 1677737/RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, DJe 29.06.2018).
A Corte Suprema, por sua vez, assevera que "a atuação monocrática, com observância das balizas estabelecidas nos arts. 21, § 1°, e 192, caput, do RISTF, não traduz violação ao Princípio da Colegialidade, especialmente na hipótese em que a decisão reproduz compreensão consolidada da Corte" (HC 144187 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, 2ª Turma, DJe 13.06.2018).
Refutam-se, as alegações do INSS quanto à impossibilidade de reconhecimento do labor especial e concessão do benefício de aposentadoria à parte autora.
De rigor a manutenção do decisum agravado.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.
É como voto.